Avicultura Alerta a avicultores
Mudança de paradigma: Ameaça da Influenza aviária agora alcança aves locais
Se antes o foco de combate à doença estava principalmente nas aves migratórias, a palestra do pesquisador Oliveiro Caetano durante o Dia do Avicultor O Presente Rural, em 24 de agosto, trouxe uma nova perspectiva.
Se antes o foco de combate à Influenza Aviária estava principalmente nas aves migratórias, a palestra do pesquisador Oliveiro Caetano durante o Dia do Avicultor O Presente Rural, em 24 de agosto, trouxe uma nova perspectiva. Para cerca de 200 avicultores do Oeste do Paraná, Caetano alertou para uma mudança de paradigma. Os cuidados agora se expandem para as aves da fauna brasileira, que já hospedam o vírus. A chegada do subtipo H5N1 ao Brasil trouxe consigo a versatilidade de transmissão entre diferentes hospedeiros, causando apreensão tanto nas aves domésticas quanto nas aves e mamíferos silvestres. Essa disseminação, antes restrita a aves migratórias, agora afeta também espécies locais, como corujas e gaviões.
Oliveiro Caetano é professor doutor em Medicina Veterinária na área de Patologia Animal e responsável pelo setor de Doença das Aves, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). É também membro do Comitê de Sanidade Avícola de Minas Gerais (Coesa). Oliveiro Caetano é pesquisador integrado em uma rede internacional que inclui especialistas do Brasil, Reino Unido, Dinamarca e Estados Unidos dedicados a estudar diferentes aspectos da epidemiologia, patogenia e controle das salmoneloses aviárias.
O pesquisador alertou sobre o subtipo H5N1, responsável por afetar cerca de 60 milhões de aves nos Estados Unidos. Para ele, esse vírus especificamente apresenta versatilidade na transmissão entre diferentes hospedeiros, o que gera grandes preocupações entre autoridades sanitárias. “Nos Estados Unidos causou doenças não só em aves domésticas, mas em várias espécies de aves e mamíferos silvestres. O vírus tem versatilidade de transmissão entre hospedeiros um pouco diferente do que a gente conhecia, é um vírus que brinca, que pula de animal, e isso causou bastante medo nas autoridades. A gente tinha medo que essas aves que saem da América do Norte pudessem trazer esse vírus para o Brasil e o vírus chegou”, menciono o pesquisador.
Com a mudança no cenário epidemiológico do Brasil, o avicultor precisa estar atento também às aves silvestres. O pesquisador entende que a transmissão por contato direto é mais difícil, mas que formas indiretas de transmissão podem atingir os planteis brasileiros com o vírus circulando em aves típicas do país. “Entre os focos registrados no Brasil, alguns são em aves de fauna local. Não é mais a ave migratória, é coruja, é gavião, que faz parte do Brasil e não faz migração. Essa questão de ave migratória a gente pode esquecer, o vírus está circulando em aves locais também. A maioria dos aviários tem proteção, o contato direto com outros animais é menos provável, mas de forma indireta pode acontecer, como água ou ração contaminados, fômites, pessoas, equipamentos usados no interior dos galpões, pragas, como insetos, moscas e roedores, que podem visitar um local com um animal infectado com IA e levar o vírus para o aviário”, alertou Caetano.
O pesquisador também destacou a viabilidade do vírus no Brasil. De acordo com ele, nas condições brasileiras o vírus vive de quatro a cinco dias no esterco (em temperaturas baixas, como na América do Norte, pode resistir até 60 dias no esterco), 24 horas em superfícies de metal ou plástico e em torno de 8 horas em roupas.
Até árvore frutífera é problema
Para evitar a entrada nas granjas brasileiras, o pesquisador elencou medidas de biosseguridade fundamentais, incluindo a restrição de entrada de pessoas e veículos, arcos de desinfecção efetivos, a necessidade de higienização frequente das mãos, desinfecção de equipamentos e fômites que entram nos aviários, manutenção do entorno limpo e até mesmo evitar o plantio de árvores frutíferas próximas aos aviários. “Tem que botar em prática aquilo que vem sendo falado há muito tempo. É um vírus nada demais em termos de resistência ao meio ambiente, é fácil de inativar ele, a gente tem isso a nosso favor. Precisamos restringir entrada de pessoas e veículos, colocar arco de desinfecção que realmente funcione e que seja efetivo, exigir banho e fornecer roupa para quem for receber visitante. Aquela granja que tem trabalhadores que não moram na granja ou que eventualmente vão visitar o vizinho ou um parente no fim de semana, exigir, quando voltar, que tome banho e faça a troca da roupa, pois ele pode sem querer levar o vírus para o aviário. Lavar a mão toda vez que entrar no aviário é um hábito importante para prevenção desses vírus e de outras doenças. Em frango, quase nenhuma granja se preocupa com a vestimenta, mas é importante. Colocar um pedilúvio que realmente funcione. É muito comum a gente fazer visitas. Quando a gente chega no aviário, ganha um propé, um saquinho. Quando chega no fim da visita ele tá todo rasgado. Se tiver alguma coisa na botina ele vai entrar e transmitir a doença para o lote. Manter o entorno limpo, sem entulhos, manter a água clorada com no mínimo 3 ppm e não usar águas superficiais, como de lagoas ou rios, manter os silos íntegros, sem vazamento de ração para atrair aves para o entorno do aviário e até não plantar árvores frutíferas, porque muitas aves silvestres vêm se alimentar dessas frutas e podem transmitir doenças”, apontou o palestrante. “O ideal é ter barracões sem atrativos, como silos bem fechados, isolados por cerca, com pedrisco no chão”, sustenta.
Produção de ovos gera mais preocupação
Em regiões onde há uma grande concentração de animais os riscos são ainda maiores, alertou o pesquisador. “Temos um medo muito grande com as regiões produtoras de ovos. As regiões de postura condensam muitas granjas em uma área muito pequena. Você tem um manejo sanitário excelente, com alto nível de tecnificação, e o vizinho de cerca tem um barracão de postura caindo aos pedaços sem nenhum controle sanitário. Na região de Bastos (SP), por exemplo, são mais de 20 milhões de galinhas em um raio pequeno. Se der um surto, uma quantidade muito grande de aves terá que ser abatida”, aponta o pesquisador. “O produtor de frango tem mais distanciamento, apesar de algumas regiões mais adensadas, o que garante uma situação muito melhor que a postura”, mencionou.
Perigos
A mudança no cenário epidemiológico também foi destacada pelo especialista. Ele ressaltou que aves migratórias ou silvestres, globalização e mercados com diferentes espécies de animais podem contribuir para a disseminação desse vírus. Além disso, ele alertou para a mutação frequente do vírus, que pode ocorrer de forma espontânea e até mesmo misturar o material genético de animais doentes com outros vírus. No Brasil temos poucos mercados de animais vivos, mas na Ásia é muito comum. Lá tem porco, coelho, mamífero silvestre, galinha, pato, tudo misturado, em uma quantidade muito grande. Esses lugares são caldeirões para o surgimento de vírus de alta patogenicidade”, apontou. “Esse vírus muta muito fácil. Pode sofrer mutações espontâneas e ainda tem propriedade de infectar animais que estão doentes com outros vírus e misturar o material genético dos dois”, ampliou, destacando que “alguns hospedeiros trazem mais medo, pois têm mais capacidade de desenvolver infecção e podem ajudar a gerar esses vírus mais agressivos. “Um deles é o suíno e o outro é o peru”.
Sinais clínicos e impactos
Entre os sinais clínicos, Oliveiro Caetano destacou que “o que realmente chama atenção é a alta mortalidade”, mas há outros sinais clínicos, como perda de apetite, prostração, mudança na coloração das barbelas e cristas, entre outros. Alertou para doenças que podem causar sinais parecidos, como botulismo, doença de Newcastle, salmonela e intoxicações de modo geral. “Não é só Influenza que causa morte aguda, mas na situação em que estamos, qualquer caso suspeito tem que ser notificado para, caso haja confirmação, o serviço oficial fazer uma operação de abafa e não deixar esse vírus se espalhar por outras granjas”, frisou o palestrante.
Os impactos de uma possível entrada nos planteis comerciais incluem, de acordo com o pesquisador, “abate de número elevado de aves, impacto ambiental, interdição da propriedade, restrição ao comércio nacional e internacional de produtos de origem animal, perda de status sanitário, redução do preço da carne do frango e desajuste de toda cadeia produtiva”. “Não dá nem pra prever, mas os impactos econômicos são imensuráveis. O momento é de não baixar a guarda, colocar em prática as medidas de biosseguridade e manter o otimismo. Pode ser que daqui há pouco a gente pare de se preocupar com esse agente, mas no momento é algo que a gente tem que tomar muito cuidado”
Pandemia em humanos
Esse vírus desperta muita preocupação das autoridades pois tem o potencial para se tornar ser responsável por uma nova pandemia entre seres humanos. “Esse vírus desperta preocupação porque muitas das pandemias de influenzas na espécie humana foram causadas por influenza tipo A, como a gripe russa, em 1889, e a gripe espanhola (1918), que matou quase um quarto da população. Desde 1997 tiveram casos de pessoas que ficaram doentes, contraíram o vírus da IA. Se contar com todas as influenzas que infectaram pessoas, são em torno de duas mil mortes, são poucas mortes (em relação a uma pandemia ou mortes por gripe, por exemplo – só a gripe sazonal mata meio milhão de pessoas por ano), mas se esse vírus ficar circulando em várias espécies, e ele vírus tem essa propriedade, pode ser que a gente tenha o surgimento de uma estirpe pandêmica, que cause um surto parecido com as outras pandemias por IA”, destacou.
Por isso, reforçou, “esse vírus é um dos mais vigiados tanto pelas autoridades de saúde humana quanto de saúde animal, pois ele pode dar origem a um vírus pandêmico”.
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Avicultura
Presidente da ABPA traça panorama da avicultura para a próxima década
Atualmente, a carne de frango brasileira é enviada para mais de 150 países, o que destaca a diversidade dos mercados atendidos e a importância estratégica do Brasil no fornecimento global do alimento.
O Brasil se consolidou como um gigante na avicultura mundial, ocupando o segundo lugar entre os maiores produtores de carne de frango do planeta, com uma produção de 14,8 milhões de toneladas em 2023. No cenário internacional, o país lidera as exportações, detendo um market share de 36,9% das vendas globais do produto, tendo exportado 5,1 milhões de toneladas no último ano, volume que gerou uma receita de US$ 9,7 bilhões.
Nos últimos 20 anos, a produção nacional de carne de frango totalizou 245 milhões de toneladas, deste total 73 milhões de toneladas foram para o mercado externo, resultando em uma receita superior a US$ 122 bilhões. Atualmente, a carne de frango brasileira é enviada para mais de 150 países, o que destaca a diversidade dos mercados atendidos e a importância estratégica do Brasil no fornecimento global do alimento.
Com 5,296 bilhões de cabeças abatidas em 2023, a indústria gera cerca de três milhões de empregos diretos e indiretos no Brasil, movimentando um Produto Interno Bruto (PIB) de R$ 92 bilhões, representando 8% do Valor Bruto da Produção (VBP) do agronegócio nacional. “Esses números reafirmam a competência e a robustez da cadeia produtiva avícola no país”, ressaltou o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Ricardo Santin, durante sua participação no 15º Encontro Mercolab de Avicultura, realizado no dia 10 de setembro em Cascavel, Oeste do Paraná.
Santin apresentou uma visão abrangente sobre a avicultura brasileira, enaltecendo o crescimento sustentado do setor e a sua capacidade de adaptação frente aos desafios globais, como as mudanças climáticas e as pressões de sustentabilidade, bem como abordou o papel do Brasil na segurança alimentar mundial, reforçando a responsabilidade de manter a qualidade e a competitividade do produto brasileiro.
Líder nacional na produção e exportação de carne de frango no ano passado, o Paraná processou 2,090 bilhões de cabeças de frango, representando cerca de 39,47% do total produzido no país, conforme dados do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). Completam o ranking dos três principais estados produtores Santa Catarina, com 13,88% (735 milhões de cabeças), e o Rio Grande do Sul, com 11,40% (604 milhões). Goiás e São Paulo assumem as posições seguintes, com 9,10% (482 milhões) e 8,65% (458 milhões), respectivamente. Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Pernambuco completam a lista dos maiores produtores, com os demais estados respondendo por 3,58% da produção. “Esses dados se referem aos frigoríficos que possuem SIF para abate das aves”, menciona Santin.
Mercado
Do total de carne de frango produzida no Brasil em 2023, 65,4% foi destinada ao mercado interno, enquanto 34,6% foi exportada, reafirmando a relevância do setor tanto para o abastecimento doméstico quanto para o comércio internacional. O desempenho nas exportações, contudo, sofreu uma leve retração no início de 2024. “Nos primeiros sete meses do ano, o Brasil exportou 3,052 milhões de toneladas de carne de frango, uma queda de 0,3% em comparação ao mesmo período de 2023, quando foram embarcadas 3,062 milhões de toneladas”, expôs Santin.
Em termos de receita, a redução foi mais significativa: os embarques geraram US$ 5,526 milhões, ante US$ 6,028 milhões no ano anterior, refletindo a oscilação dos preços no mercado global. “Esse cenário é reflexo do recente caso da Doença Newcastle no Rio Grande do Sul, estado que teve suas exportações barradas para vários países, mas que com a atuação rápida da defesa sanitária do país controlou o foco e restabeleceu as exportações, porém ainda algumas nações não retomaram as compras do estado e nem do país”, avisa Santin.
Principais destinos das exportações em 2024
Entre janeiro e julho de 2024, a China se manteve como o principal destino da carne de frango brasileira, com 160,261 mil toneladas importadas, seguida pelos Emirados Árabes Unidos (117,002 mil toneladas) e pela África do Sul (107,079 mil toneladas). Japão e Arábia Saudita completaram o top 5, com 84,012 mil e 60,540 mil toneladas, respectivamente. Filipinas, Iraque, União Europeia, México e Coreia do Sul também se destacaram como mercados relevantes para o produto brasileiro.
O Paraná se mantém como o maior estado exportador de carne de frango do país, com uma participação de 42% das exportações totais. Apenas entre janeiro e julho de 2024, o estado embarcou 1,3 milhão de toneladas.
Crescimento moderado na produção e exportações
O setor de carne de frango no Brasil segue em constante expansão, com projeções de crescimento moderado para os próximos anos. O país detém 14,6% do market share da produção global, sendo o segundo maior produtor de carne de frango no mundo. Os Estados Unidos lideram com 20,6% da produção, enquanto a China aparece em terceiro lugar com 14%. A União Europeia (UE) segue com 10,9%, e a Rússia completa o ranking dos principais produtores, com 4,8%.
De acordo com estimativas da ABPA, a produção brasileira de carne de frango deve atingir 15,1 milhões de toneladas em 2024, representando um aumento de 1,8% em relação ao volume produzido em 2023. Para 2025, a expectativa é que a produção continue a subir, alcançando 15,35 milhões de toneladas, o que corresponde a um crescimento de 2,3%.
Quando se trata de exportações, o Brasil se destaca ainda mais, liderando o mercado mundial com 36,9% de participação. Esse desempenho coloca o país à frente dos Estados Unidos, que ocupam a segunda posição com 23,7% do share global, seguidos pela União Europeia com 12,3%, Tailândia com 7,9% e China com 3,69%. “Essa liderança reflete a eficiência do setor avícola brasileiro, que é amplamente reconhecido pela qualidade de seus produtos e sua capacidade de atender a mercados exigentes”, salienta Santin.
A ABPA projeta que o país exporte até 5,25 milhões de toneladas de carne de frango em 2024, uma alta de 2,2% em comparação com o ano anterior. No entanto, o ritmo de crescimento das exportações deve ser um pouco mais moderado em 2025, com uma projeção de 5,35 milhões de toneladas exportadas, um aumento de 1,9%.
Já em termos de disponibilidade interna, o mercado brasileiro também deve registrar crescimento. A estimativa para 2024 é de que 9,85 milhões de toneladas estejam disponíveis no mercado doméstico, um acréscimo de até 1,6%. Para o ano seguinte, a previsão é de um crescimento de 1,5%, o que resultaria em 10 milhões de toneladas disponíveis para o consumo no Brasil.
Quanto ao consumo per capita de carne de frango, a expectativa é de estabilidade. O consumo deve se manter em torno de 45 quilos por habitante em 2024, com estimativa de aumentar para 46 quilos per capita em 2025. Essa estabilidade reflete a forte presença da carne de frango na alimentação dos brasileiros, consolidando-a como uma das principais fontes de proteína animal no país.
Aumento dos custos de produção
Apesar do forte desempenho no mercado mundial, o setor de carne de frango no Brasil enfrenta desafios relacionados ao aumento dos custos de produção. Em 2018, o custo do quilo do frango vivo era de R$ 2,80, mas em 2024 esse valor subiu para R$ 4,42, refletindo o impacto de diversos fatores econômicos. No entanto, de 2023 até julho de 2024, houve uma redução de 5,4% nos custos de produção, um alívio para os produtores, embora o cenário ainda demande atenção.
Os principais insumos do setor, o milho e a soja, representam mais de 70% dos custos de produção, sendo fundamentais para a alimentação das aves. Em agosto de 2024, o preço da saca de 60 kg de milho chegou a R$ 59,60, enquanto a soja alcançou R$ 129,20 por saca, pressionando as margens de lucro dos produtores. “Essa volatilidade nos preços dos insumos é uma preocupação constante, especialmente em um contexto de demanda crescente por carne de frango tanto no mercado interno quanto externo”, menciona Santin, acrescentando: “O mercado avícola brasileiro, apesar dos desafios, continua a se destacar globalmente pela sua capacidade produtiva e pela liderança nas exportações, mas a gestão eficiente dos custos será crucial para manter a competitividade nos próximos anos”.
Desafios logísticos ameaçam competitividade
O agronegócio brasileiro, um dos setores mais robustos da economia, enfrenta grandes desafios logísticos que ameaçam sua competitividade no cenário global. Um dos principais problemas está relacionado à defasagem da infraestrutura portuária, com o Brasil operando 12 anos e quatro gerações de navios atrás das tecnologias de ponta disponíveis mundialmente. “Essa defasagem impacta diretamente a capacidade de escoamento da produção nacional, essencial para atender à demanda crescente por produtos agropecuários no exterior”, aponta Santin.
Em 2021, a situação atingiu um ponto crítico: a demanda por cargas nos portos brasileiros ultrapassou a capacidade operacional de todos os terminais. E as projeções, segundo Santin, indicam que a tendência é de agravamento nos próximos anos, à medida que a produção agrícola e pecuária continua a crescer. O gargalo logístico tem repercussões tanto para armadores quanto para embarcadores, criando um cenário de ineficiência e custos elevados.
Impactos para os armadores: filas e navios menores
Para os armadores, a falta de capacidade nos portos resulta em longas filas de navios aguardando atracação. A escassez de infraestrutura moderna força o uso de navios menores, que, além de menos eficientes, aumentam o tempo e os custos das operações. “Isso gera um acúmulo de embarcações paradas nos portos, elevando os gastos e prejudicando a fluidez das exportações”, ressalta.
Desafios para os embarcadores
Para os embarcadores, a logística ineficiente gera uma série de desafios adicionais. Entre os problemas mais significativos está a dificuldade de entregar as cargas a tempo nos portos, o que obriga as empresas a aumentar os estoques de produtos e, consequentemente, eleva os custos de armazenagem e transporte. “As despesas portuárias também sobem, pressionando as margens de lucro de produtores e exportadores”, salienta Santin.
Além disso, os atrasos na entrega das mercadorias aos clientes internacionais comprometem a reputação dos exportadores brasileiros e podem resultar na perda de contratos. “A incapacidade de escoar a produção de forma eficiente limita o volume de produção, já que os produtores se veem forçados a frear a produção para evitar acúmulos indesejados nos estoques”, comenta Santin.
O cenário logístico brasileiro exige atenção urgente, especialmente para manter a competitividade do agronegócio. “A modernização da infraestrutura portuária e o investimento em soluções logísticas mais eficientes são fundamentais para garantir que o setor continue a crescer para atender à crescente demanda global”, reforça o presidente da ABPA.
Compromisso com a sustentabilidade
A avicultura brasileira se destaca por seu compromisso com a sustentabilidade, o que tem fortalecido sua posição no mercado global. O setor adota práticas e tecnologias que, além de promover ganhos produtivos, também otimizam o uso de recursos naturais, contribuindo para a preservação ambiental e a redução da pegada de carbono.
Entre as principais iniciativas está o uso crescente de energia solar nas granjas, que tem ajudado a reduzir os custos com eletricidade e, ao mesmo tempo, diminuir o impacto ambiental. “Outro avanço importante é o uso de biodigestores, que transformam resíduos orgânicos gerados pela produção avícola em biogás, uma fonte de energia limpa e renovável, além de gerar biofertilizantes que podem ser reutilizados nas lavouras, fechando o ciclo de sustentabilidade”, sustenta Santin.
A atividade também é favorecida pelo uso de insumos produzidos localmente, como milho e soja, ingredientes fundamentais na alimentação das aves. Isso não só fortalece a economia interna, mas também reduz a dependência de importações e minimiza a pegada de carbono associada ao transporte de insumos.
Outro ponto de destaque é que a produção de carne de frango no Brasil ocorre majoritariamente fora do bioma amazônico, preservando uma das áreas mais sensíveis e biodiversas do mundo. “A escolha de áreas com condições climáticas favoráveis para a criação de aves contribui para a redução do uso de energia e insumos, já que essas regiões oferecem um ambiente natural adequado para a produção em larga escala”, menciona.
Além disso, a aplicação de tecnologias voltadas para o aumento da eficiência produtiva tem permitido ao setor otimizar o uso de água, grãos e energia. Sistemas de monitoramento avançado e automação em granjas garantem o controle rigoroso de cada etapa da produção, desde a alimentação das aves até o controle climático dos aviários, promovendo a sustentabilidade e o bem-estar animal.
Essas iniciativas refletem o compromisso da avicultura brasileira com a sustentabilidade, reforça Santin, um diferencial competitivo que vem ganhando relevância nos mercados internacionais, onde consumidores estão cada vez mais exigentes em relação à origem e impacto ambiental dos produtos que consomem. “O setor avícola do Brasil demonstra que é possível crescer de forma responsável, contribuindo para a preservação do meio ambiente e garantindo a produção eficiente de alimentos de qualidade”, enaltece Santin.
Drivers de mudança mundial até 2030
Até 2030, três grandes drivers continuarão a moldar o cenário global: o crescimento populacional, o crescimento econômico e o aumento da renda per capita. “Esses fatores terão impacto profundo nas dinâmicas globais, exigindo adaptações tanto das economias quanto das sociedades para lidar com os desafios e aproveitar as oportunidades”, enfatizou Santin.
A Organização das Nações Unidas estima que a população global chegue 8,5 bilhões de pessoas até 2030. Esse aumento populacional pressiona ainda mais os recursos naturais e os sistemas urbanos, especialmente nas regiões com maior densidade demográfica, como o Sul da Ásia e partes da África Subsariana. As previsões econômicas indicam um crescimento global, mas com ritmos diferentes entre regiões. “As economias emergentes, como Índia, Indonésia e África, despontam como as grandes protagonistas, impulsionadas por investimentos em tecnologia, industrialização e educação. Ao mesmo tempo, desafios como as mudanças climáticas e as tensões geopolíticas poderão impactar negativamente o crescimento em algumas regiões. Países que conseguirem investir em energia renovável e inovação tecnológica estarão mais bem posicionados para enfrentar as incertezas”, aponta Santin.
O aumento da renda per capita em várias partes do mundo será um fator-chave para impulsionar o consumo e elevar a qualidade de vida de milhões de pessoas. No entanto, esse crescimento trará consigo desafios, como a necessidade de equidade econômica e social. “O poder de compra crescente de novas classes médias, principalmente na Ásia, impulsionará novos mercados, criando uma demanda cada vez maior por alimentos que primam pela qualidade e sustentabilidade, o que torna o Brasil ainda mais importante no cenário global”, avalia Santin.
Consumo global de proteína animal
O consumo global de proteína animal está projetado para crescer mais de 14% até 2033, impulsionado por fatores como o aumento populacional, a elevação da renda e mudanças nas preferências alimentares dos consumidores. De acordo com dados recentes da Rabobank, o crescimento varia entre diferentes tipos de proteína, com as aves liderando a expansão, registrando um aumento de mais de 22%, seguidas pelos ovos (mais de 21%) e os frutos do mar (mais de 12%). O consumo de carne bovina deve crescer mais de 9%, enquanto o de carne suína espera um aumento superior a 7%.
Os mercados emergentes serão os grandes responsáveis por esse crescimento, respondendo por 90% da expansão no consumo de proteínas até 2033. A Ásia, com estimativa de aumento de 55%, é a região mais promissora, seguida pela América Latina, com crescimento de 20%, e pela África, com 15%. Mercados desenvolvidos, por outro lado, devem contribuir com apenas 10% desse aumento, refletindo uma maturidade no consumo e uma mudança para hábitos mais sustentáveis.
Santin reforça que o avanço do consumo de proteína animal está diretamente relacionado ao crescimento populacional, que deve atingir 9,7 bilhões de pessoas até 2050, e ao aumento da renda, permitindo que mais pessoas em regiões emergentes tenham acesso a essas fontes alimentares. Além disso, a preferência dos consumidores por dietas ricas em proteínas segue se diversificando, com maior ênfase em proteínas mais saudáveis e sustentáveis.
Perspectiva geopolítica e impacto dos BRICS+
Do ponto de vista geopolítico, países do BRICS+ desempenharão um papel importante na expansão da demanda por proteínas. Juntos, os BRICS devem representar 45% desse crescimento, enquanto a expansão para BRICS+ (com a inclusão de novos países) pode alcançar 50%. “Se considerados os potenciais novos membros do BRICS+, essa participação pode chegar a 75%”, salienta Santin.
Em contraste, os países ocidentais são responsáveis por apenas 10% desse crescimento, revelando uma clara transferência da demanda para as economias emergentes.
Insegurança alimentar
Apesar das projeções de aumento no consumo de proteínas, o relatório “O Estado da Segurança Alimentar e da Nutrição no Mundo”, o Sofi, publicado em julho de 2024, revela um quadro alarmante. Em 2023, cerca de 733 milhões de pessoas, o equivalente a uma em cada 11 no mundo, passaram fome, com destaque para a África, onde uma em cada cinco pessoas sofre de insegurança alimentar. O relatório aponta que o mundo retrocedeu 15 anos, com níveis de desnutrição semelhantes aos de 2008/2009. “Caso as tendências atuais continuem, estima-se que 582 milhões de pessoas estarão cronicamente subnutridas em 2030”, alerta Santin.
Além disso, cerca de 2,33 bilhões de indivíduos enfrentaram insegurança alimentar moderada ou grave em 2023, destacando a necessidade urgente de soluções para equilibrar o aumento da demanda por alimentos com a realidade da fome global.
Desafios e oportunidades na produção de proteínas
A crescente demanda por proteínas vem acompanhada de desafios importantes. Segundo Santin, as emissões de gases de efeito estufa, o desmatamento e a perda de biodiversidade encabeçam a lista de questões a serem enfrentadas pela indústria. Outros desafios incluem o uso e a escassez de água, resíduos e contaminação hídrica, uso de antibióticos, condições de trabalho, bem-estar animal e segurança alimentar.
Por outro lado, o setor também encontra oportunidades, especialmente no desenvolvimento de proteínas sustentáveis e alternativas, que ganham força como uma solução para reduzir o impacto ambiental da produção de alimentos. “Governança eficiente e práticas mais responsáveis serão fundamentais para que a indústria de proteínas possa atender à crescente demanda global sem comprometer os recursos naturais e a saúde do planeta”, afirma Santin, enfatizando que a indústria de proteínas enfrenta uma década decisiva, onde os desafios ambientais, sociais e econômicos precisarão ser equilibrados com o crescimento da demanda, especialmente nos mercados emergentes, para garantir uma cadeia de produção sustentável e inclusiva.
Competitividade do setor
Como uma das mais robustas do mundo, a avicultura brasileira se destaca por pontos de excelência que garantem sua competitividade no cenário global. Entre os fatores que impulsionam o sucesso do setor, Santin menciona os recursos naturais abundantes, como a vasta disponibilidade de grãos para ração, e o uso avançado de tecnologia e conhecimento. “O Brasil investe de forma massiva em inovação, com melhorias em genética, nutrição e manejo, resultando em ganhos de eficiência produtiva”, destaca.
Outro ponto diferencial do setor é o empreendedorismo rural, com produtores comprometidos com as boas práticas e a modernização constante. “A coordenação das cadeias de valor também fortalece a posição da avicultura brasileira, assegurando que a produção, processamento e exportação estejam bem integrados, o que facilita a competitividade em mercados externos”, evidencia Santin.
Entraves da avicultura brasileira
Apesar dos fatores positivos, o setor enfrenta entraves que limitam seu potencial. Entre os quais, Santin cita a logística e a infraestrutura como os maiores desafios, especialmente em relação ao escoamento da produção para os portos de exportação. “A precariedade de estradas e a alta dependência do modal rodoviário elevam os custos e comprometem a competitividade no mercado internacional”, pontua.
Outro entrave está relacionado às tarifas de importação e à falta de acordos comerciais mais amplos, que restringem o acesso a mercados estratégicos e tornam as exportações “O sistema tributário complexo e a insegurança jurídica no Brasil também são obstáculos significativos, afetando a previsibilidade dos negócios e o ambiente de investimentos no setor”, afirma.
Principais pontos de atenção para 2024
O presidente da ABPA ressalta que 2024 traz uma série de fatores externos que devem ser monitorados pela avicultura brasileira. O conflito entre Rússia e Ucrânia continua a afetar o mercado de grãos, insumos essenciais para a produção de ração, pressionando os custos de produção. Além disso, as tensões no Oriente Médio e as eleições presidenciais nos Estados Unidos podem gerar instabilidades no comércio internacional e afetar os fluxos de exportação.
As enfermidades sanitárias como Influenza Aviária, Doença de Newcastle e Peste Suína Africana também exigem atenção redobrada, com a necessidade de reforçar medidas de biosseguridade para evitar impactos na produção e exportação.
Outro ponto crítico citado por Santin são os custos de produção, que continuam altos devido à volatilidade dos preços dos grãos, como milho e soja, principais componentes da ração animal. “A sustentabilidade e as mudanças climáticas também ganham cada vez mais relevância, com consumidores e mercados exigindo práticas mais sustentáveis ao longo de toda a cadeia produtiva”, reforça.
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Aves não sentem sabor: MITO!
Evidências comportamentais e genéticas já demonstraram que as aves têm uma capacidade precisa para detectar diferentes modalidades gustativas, desafiando o amplo consenso de que as aves têm menor acuidade gustativa do que os mamíferos.
A revisão cronológica da anatomia relacionada ao paladar e comportamento alimentar das aves mostra um atraso de 50 anos na descoberta do sistema gustativo (papilas gustativas), em comparação com mamíferos. Este fato está relacionado ao entendimento de que as aves não possuem papilas gustativas na língua e uma secreção limitada de saliva.
No entanto, hoje sabe-se que o sistema gustativo é o sentido que evoluiu do sistema quimio-sensorial presente na cavidade oral de aves, a fim de avaliar o valor nutricional dos alimentos, detectando compostos relevantes, como aminoácidos, ácidos, peptídeos, carboidratos, lipídios, cálcio, sais e compostos tóxicos ou antinutricionais.
O que dizem as pesquisas recentes?
Nos últimos anos surgiram novos estudos, principalmente devido ao advento da metagenômica, os quais evidenciaram que o sistema gustativo é tão crucial para as aves quanto para os mamíferos. Apesar de muitas semelhanças, também existem diferenças fundamentais entre os sistemas gustativos de aves e mamíferos em termos de anatomia, distribuição das papilas gustativas, natureza e estrutura molecular dos receptores gustativos. Geralmente, as aves têm cavidades orais menores, menor número de papilas gustativas e sua distribuição na cavidade oral segue o padrão de deglutição dos alimentos. Além disso, as diferenças entre as espécies de aves no tamanho, estrutura e distribuição das papilas gustativas estão associadas ao tipo de dieta e outras adaptações ecológicas.
Como ocorre a percepção de sabores pelas aves?
As aves têm mais diversidade em termos de estruturas anatômicas das papilas gustativas, com pelo menos três tipos identificados. Além disso, os padrões de distribuição das papilas gustativas são mais diversos e estão localizados principalmente no palato, e não na língua. As aves possuem capacidade de perceber sabores doces, umami, azedos, amargos, ácidos, salgados, cálcicos e de gorduras.
E o uso de palatabilizantes nas dietas?
O uso de palatabilizantes pode melhorar o sabor de uma ração para torná-la mais atraente para o animal ou até mesmo mascarar sabores desagradáveis. Consequentemente, há aumento da ingestão, resultando maior desempenho zootécnico e maior produtividade. Além disso, há uma ligação direta entre a palatabilidade do alimento e o bem-estar animal, uma vez que uma dieta palatável estimula os sentidos e traz emoções positivas à ave.
As aves podem restringir o consumo quando percebem sabores muito intensos?
Sobre o acesso a uma água ou alimento com características muito ácida/azeda/amarga/alcalina, há uma restrição de consumo por mecanismos de defesa do próprio animal. Por exemplo, estudos em aves mostraram que, em geral, existe uma tolerância ao meio ácido ou soluções alcalinas, mas evitando soluções ácidas ou alcalinas extremas.
Qual é a importância do entendimento da percepção sensorial em aves?
O paladar das aves desempenha um papel fundamental na escolha da ração e no seu nível de consumo. Por exemplo, é comum que frangos de corte e poedeiras tenham uma preferência por ingredientes que contenham cálcio na sua composição, como grãos, ossos e cascas. Estes sinais gustativos podem desempenhar um papel fundamental no reconhecimento de dietas deficientes ou suplementadas com cálcio.
As aves são mais sensíveis aos sabores da água do que aos sabores da ração, consumindo quase o dobro da água em relação à ração. É conhecido que as aves preferem água levemente ácida ou água suplementada com tiamina e açúcares, rejeitando sabores como xilose e sacarina. É comum observarmos no campo que quando as aves possuem acesso a uma água de pH natural alcalino que passa a ser acidificada, há um aumento expressivo no consumo de água. Por outro lado, quando este processo de acidificação ocorre de forma muito intensa, baixando-se muito o pH, verifica-se uma redução do consumo.
Uma grande diversidade de vitaminas, minerais ou ácidos orgânicos são comumente adicionados a dieta dos animais, seja via água ou ração. No entanto, o efeito da palatabilidade destes aditivos sobre o consumo dos animais é amplamente conhecido na suinocultura e pouco explorado para as aves. Alguns estudos já demonstraram que produtos à base de ácido acético, fórmico e propiônico, por exemplo, não são tão palatáveis quanto produtos à base de ácido fosfórico, cítrico e ascórbico. Considerando que as aves possuem uma percepção gustativa bem desenvolvida, a composição destes aditivos é fator determinante para estímulo ou restrição ao consumo de uma água ou ração tratada com estes produtos.
Conclusões
Evidências comportamentais e genéticas já demonstraram que as aves têm uma capacidade precisa para detectar diferentes modalidades gustativas, desafiando o amplo consenso de que as aves têm menor acuidade gustativa do que os mamíferos. Desta forma, trabalhar com a nutrição de modo a promover a palatabilidade das dietas e estimular o consumo de água e ração é uma prática fundamental para garantir o sucesso da produção.
As referências bibliográficas estão com os autores. Contato: marketing@americannutrients.com.br.
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Avicultura
Reovírus: o inimigo que abala a agroindústria avícola
Classificado como um vírus entérico de infecções persistentes, é altamente resistente no ambiente.
O Reovírus tem se destacado como uma preocupação central para a agroindústria, especialmente no que diz respeito às condenações parciais que afetam a cadeia produtiva. Este tema foi amplamente debatido durante o 15º Encontro Mercolab de Avicultura, realizado no dia 10 de setembro em Cascavel, no Oeste do Paraná. O médico-veterinário Jônatas Wolf, especialista em Avicultura e mestre em Zootecnia, destacou a relevância do Reovírus no cenário atual, apontando suas implicações na saúde das aves e os desafios para o setor.
Entre os principais problemas enfrentados pela agroindústria estão as bolhas hemorrágicas, lesões visíveis na articulação tíbio-tarsal das aves. Essas alterações, que variam de cor vermelha-rubro a arroxeada ou esverdeada, são resultados de derrames sanguíneos causados por alterações vasculares, sem lesões ou comprometimento estrutural. Embora a integridade dos ossos, os tendões e a fisiologia sejam preservados, o dano impacta visualmente o produto, sendo um fator de condenação parcial ou total. “Embora a lesão seja asséptica e não comprometa a estrutura articular ou óssea da ave, a alteração morfológica da perna resulta em condenações parciais que, no acumulado de 2023, variaram entre os estados brasileiros”, frisou. “Condenações parciais por artrite superaram 3% em dezembro do ano passado, com destaque para Goiás, Minas Gerais, Santa Catarina e São Paulo. Bahia e Rio Grande do Sul, por sua vez, registraram condenações totais superiores à média nacional de 0,07%”, expôs o profissional.
O Reovírus, classificado como um vírus entérico de infecções persistentes, é altamente resistente no ambiente. Sua capacidade de permanência por até 10 dias em penas, ração e ovos, além de resistir até 10 semanas na água, o torna um desafio contínuo. Sua transmissão se dá tanto de forma vertical, das matrizes para os pintinhos, quanto horizontal, através do contato ave a ave, com a via fecal-oral sendo determinante nesse processo.
Wolf enfatizou que um dos principais esforços da agroindústria tem sido a implementação de soluções sanitárias mais rigorosas, a fim de reduzir a pressão de infecção nas unidades de produção.
Patogenia e virulência
Outro ponto destacado pelo médico-veterinário foi a patogenia e virulência do Reovírus, abordando sua influência sobre a saúde das aves.
De acordo com dados apresentados por Wolf, entre 85% e 90% dos Reovírus não são patogênicos, ou seja, não causam doenças clinicamente relevantes nas aves. No entanto, uma pequena parcela de Reovírus patogênicos está diretamente relacionada a uma série de manifestações clínicas e lesões que afetam diretamente a produção avícola.
As formas clássicas da doença causada pelo Reovírus incluem artrite, tenossinovite, síndrome de nanismo e raquitismo, hepatite, miocardite com hidropericárdio, osteoporose, síndrome de má absorção, imunossupressão, além de doenças respiratórias e entéricas. “Nas formas clínicas típicas, as lesões mais comuns envolvem a articulação tarsometatarsal, aumento dos tendões flexores e focos necróticos no coração, baço e fígado, o que compromete a saúde das aves e pode levar a condenações parciais ou totais no abate”, menciona.
Wolf explicou detalhadamente a fisiopatologia do Reovírus nas aves, apontando o impacto da artrite causada por esse agente. “O Reovírus, na sua patogênese, provoca lesões que afetam a locomoção das aves. O aumento do edema nas pernas, somado ao cisalhamento das fibras tendinosas, causa o extravasamento de conteúdo, com infiltração de células neurositárias e linfocitárias, fazendo a ave perder a capacidade de locomoção”, detalhou Wolf.
O especialista também destacou que as lesões clássicas de uma ave com as pernas abertas ou com os dedos enrijecidos não são a causa mais comum de condenações. “As lesões que frequentemente levam à notificação no abate são de natureza vesicular, inclusive, a identificação dessas lesões no campo é muitas vezes difícil, devido à sua progressão limitada à morfologia externa, sem comprometimento articular mais profundo”, expõe.
O desafio para a agroindústria reside na detecção precoce e não controlar essas lesões, minimizando os prejuízos econômicos decorrentes das condenações. Ao mesmo tempo, a importância de compreender a fisiopatologia e os mecanismos de ação do Reovírus abre oportunidades para o desenvolvimento de novas estratégias de controle e manejo sanitário, além da implementação de medidas preventivas mais eficazes.
O cenário atual reforça a necessidade de uma abordagem integrada, com foco na redução da pressão de infecção através de intervalos sanitários mais rigorosos e controle de transmissão vertical e horizontal. A busca por soluções mais eficientes, aliadas à conscientização sobre a complexidade do Reovírus, é um passo crucial para mitigar os impactos econômicos e sanitários que essa doença impõe ao setor avícola.
Vacinas autógenas
O diagnóstico do Reovírus em aves é determinante para identificar e controlar surtos que causam prejuízos expressivos à indústria avícola. Em casos suspeitos, a avaliação clínica é seguida pela realização do RT-qPCR, que identifica o vírus. Wolf explica que se o valor de Cq obtido for superior a 30 é realizado uma passagem do vírus em ovo embrionado para aumentar sua propagação. “Esse isolado é, então, utilizado na produção de vacinas autógenas e contribui para a construção da árvore filogenética dos vírus identificados”, ressaltou.
Impacto do Reovírus
A artrite, uma das manifestações clínicas mais comuns associadas ao Reovírus, está entre as três principais causas de condenações nas agroindústrias. Entre 2008 e 2015, houve um aumento de 95% na incidência do vírus nos EUA, com predominância dos clusters II e V. No Brasil, os clusters I, II e V foram identificados, com ou sem associação à doença. Embora a confirmação entre o genótipo e a doença seja ainda inconclusiva, a presença desses clusters é um indicativo importante para o monitoramento.
Fatores predisponentes
A presença do Reovírus em regiões com alta densidade de aviários, como o Oeste do Paraná – uma das maiores regiões produtoras do Brasil – eleva os riscos de infecção. Outros fatores incluem uso excessivo de cama, falhas de biossegurança regionais, desinfecção deficiente e falhas no controle de temperatura (frio ou abafamento). “A qualidade dos pintos também influencia a gravidade do quadro, especialmente quando as matrizes são muito jovens ou velhas, ou quando há falhas na incubação. Além disso, dietas com alta densidade de nutrientes, deficiência marginal de vitaminas, presença de micotoxinas e infecções subclínicas por outros agentes agravam o problema”, salienta Wolf.
O Reovírus é envelopado, persistente no ambiente e resistente a desinfetantes. A Universidade da Califórnia realizou um estudo que demonstrou que a transmissão vertical/transovariana pode responder por cerca de 2 a 5% dos casos em frangos de corte, ou seja, o vírus representa entre 95 a 97% da pressão na cadeia produtiva. Por sua vez, a gestão da cama é um fator relevante para transmissão horizontal (via fecal/oral), visto que o vírus é capaz de sobreviver por longos períodos no ambiente. “Embora as perdas econômicas sejam expressivas, a performance zootécnica não é afetada, o grande impacto se dá no Brasil pelas condenas”, afirma Wolf.
Prevenção
A prevenção ao Reovírus requer um programa de biosseguridade abrangente, que inclua vacinação com vacinas comerciais e autógenas, formação de lotes de origem única, alojamento em microrregiões e uma série de medidas de manejo que visem a redução da pressão de infecção. Procedimentos como a correta gestão da cama, intervalos sanitários prolongados e programas diferenciados de infecção e higienização dos galpões são essenciais para controlar o vírus, considerado um agente primário neste processo.
Vacinação como ferramenta no controle do Reovírus
A vacinação contra o Reovírus em aves tem sido uma ferramenta fundamental na prevenção e controle da doença, especialmente para reduzir a transmissão vertical das matrizes para os frangos de corte. A imunização dessas matrizes não só diminui o risco de transmissão transovariana, mas também transfere anticorpos protetores para a progênie.
No Brasil, as vacinas disponíveis incluem as inativadas, que contêm diversas cepas e oferecem uma proteção ampla, além de vacinas vivas e modificadas. No entanto, o controle eficaz por meio de vacinas autógenas enfrenta ainda obstáculos. “A alta variabilidade gênica e a capacidade de mutação do Reovírus, associada à diversidade antigênica dos clusters, comprometem a eficácia das vacinas, dificultando uma proteção completa contra todas as cepas circulantes”, afirma o médico-veterinário, acrescentando: “A principal dificuldade é a resposta imune das aves jovens, que ainda não está completamente desenvolvida, o que pode limitar a eficácia das vacinas. A proteção a curto prazo é difícil de alcançar, e isso gera dúvidas sobre as soluções reais dessa prática”.
Outro ponto elencado pelo especialista é a produção de vacinas autônomas no Brasil, que ainda enfrenta barreiras regulatórias e
operacionais. A regulamentação atual recomenda que a revisão e a regulação das cepas utilizadas nas vacinas autógenas ocorram a cada 15 meses. No entanto, devido à dinâmica do vírus, esta revisão tem sido feita a cada seis meses. “Isolar o agente patogênico de forma correta por região é determinante para o sucesso do programa de vacinação. Porém, os números mostram que ainda não somos competentes nessa identificação”, explicou Wolf.
Experiências práticas e lições aprendidas
Até cinco anos atrás, o isolamento do Reovírus em aves era um grande desafio, mas os avanços nas práticas de isolamento reduziram de forma significativa essa dificuldade. Hoje, segundo Wolf, os melhores órgãos-alvo para identificar e isolar o vírus são o líquido articular e o tendão, permitindo diagnósticos mais precisos e rápidos.
Entretanto, o Reovírus apresenta uma grande complexidade em sua imunogenicidade, principalmente devido à sua variabilidade genética e à dificuldade de se customizar uma resposta imunológica adequada. O profissional expõe que enquanto outros programas de imunização em aves oferecem até 95% de proteção, estudos mostram que a imunidade contra o Reovírus alcança em média 38%, refletindo a natureza resistente do vírus, que é desprovida de envelope e se espalha principalmente via transmissão horizontal. “Dados indicam que apenas 3% da transmissão ocorre de forma vertical, o que reforça a importância de focar os esforços na redução da contaminação horizontal”, reforça Wolf.
Nesse sentido, práticas de manejo, como o trabalho adequado com a cama dos aviários, o prolongamento dos intervalos entre lotes e a diminuição da pressão nos aviários têm se mostrado fundamentais para reduzir a contaminação fecal-oral, uma das principais vias de transmissão do Reovírus.
Avanços e desafios na cadeia produtiva
Conforme Wolf, as discussões com as casas de genética também se intensificaram, abordando temas como a idade da matriz reprodutora e a possibilidade de ajustes nas configurações de incubação e hipóxia, com o objetivo de melhorar os resultados e reduzir as condenações. Além disso, aspectos relacionados ao ganho de peso diário (GPD), peso ao abate, resistência óssea, fragilidade vascular e condições de cama são apontados como possíveis fatores agravantes para o desenvolvimento do Reovírus.
Para ficar atualizado e por dentro de tudo que está acontecendo no setor de avicultura acesse a versão digital de avicultura de corte e postura, clique aqui. Boa leitura!Wolf enfatiza que é essencial continuar melhorando o manejo dentro dos aviários, com foco em evitar o abafamento e garantir a ventilação mínima adequada. “É necessário corrigir intervalos sanitários mais longos, sendo que 12 dias são considerados insuficientes. A recomendação é fermentar a cama por no mínimo oito dias ou trocá-la completamente, especialmente na fase inicial da criação (pinteiro). A desinfecção das instalações deve ser completa, com higienização úmida ao invés de seca, especialmente nos aviários positivos para o Reovírus. Além disso, a separação e o manejo deve ser feito por microrregiões, o transporte adequado das rações e a logística de carregamento entre regiões positivas e negativas para o vírus são passos importantes para evitar a propagação do vírus”, evidencia o profissional.
O emprego adequado da vacinação, em conjunto com esses cuidados de manejo e biosseguridade, é imprescindível para minimizar o impacto do Reovírus na avicultura e garantir uma produção mais segura e eficiente.
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