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Soluções inovadoras impulsionam a transição energética da indústria brasileira
Biomassa e resíduos da agropecuária têm papel fundamental para diminuir a participação de combustíveis fósseis no setor de transportes.

Um dos líderes mundiais na produção agropecuária, o Brasil tem grande potencial para ampliar o uso de biomassa e resíduos do campo como fontes produtoras de energia limpa e renovável. A biomassa de cana representou 15,4% da oferta interna de energia no Brasil em 2022. É a maior parcela entre as fontes renováveis de energia que compõem a atual matriz nacional, conforme indica o quadro abaixo. A informação é do Relatório Síntese do Balanço Energético Nacional 2023, da Empresa Nacional de Energia, ligada ao Ministério de Minas e Energias (MME) – disponível on-line aqui,
O entendimento e a aplicação do conceito de circularidade é um dos pilares para se alcançar maior eficácia no processo de transição energética. A ideia básica é diminuir ao máximo a produção de resíduos que, em uma situação ideal, chegaria a zero, ou seja, não geraria lixo ou qualquer material a ser descartado.
No setor agropecuário, a produção do etanol de cana-de-açúcar é um dos exemplos em que esse ideal é quase atingido devido ao alto índice de aproveitamento da biomassa de cana. Originalmente, produz-se etanol e os restos que ficam no campo após a colheita, a palha da cana, em vez de ser descartada, é aproveitada para gerar dois subprodutos comercializáveis: bioinsumos e biocombustíveis de segunda geração O biogás obtido desses resíduos atende, por exemplo, à demanda do setor de transportes por matérias-primas renováveis que diminuam a pegada de carbono do setor automobilístico. E os bioinsumos servem de fertilizantes naturais que incrementam a produtividade da própria cana e de outras culturas agrícolas.
No Brasil, esse é um potencial subaproveitado já que apenas 17% da capacidade instalada no setor sucroenergético está em operação. Para efeitos comparativos, no setor petrolífero, o índice de aproveitamento é quase pleno (97%). “Temos cerca de 60 indústrias que podem produzir 14,6 bilhões de litros de etanol por ano. Mas nossa estimativa é que, até o final de 2023, consigamos produza menos da metade desse montante”, lamenta Donizete Tokarski, diretor-Superintendente da União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabrio). “Precisamos diminuir essa ociosidade para que possamos dar toda a contribuição que está ao nosso alcance nesse processo de transição energética”, destaca.
Para Donizete, a Embrapa tem um papel fundamental como parceira na superação desse e de outros entraves que o segmento ainda enfrenta. Em suas palavras, “por ser uma empresa de excelência reconhecida mundialmente e instituição vinculada ao Estado, a Embrapa tem total capacidade e legitimidade para atuar em favor de políticas públicas necessárias para ampliar a participação do agro brasileiro nesse processo”.
Outras culturas com potencial para produção de biomassa
Além da cana, outras culturas agrícolas, como o milho, a soja e a canola fornecem biomassa como matéria-prima para o etanol e, potencialmente, para a produção de combustíveis verdes. Nos EUA, por exemplo, prevalece o etanol de milho como alternativa aos fósseis. No Brasil, assim como o etanol de cana, substratos de outras culturas agrícolas podem compor a mistura de combustíveis fósseis como elemento redutor da quantidade de gases poluidores emitidos quando usamos gasolina e diesel.

Fotos: Juliana Escobar
Diminuir a ociosidade da capacidade instalada do segmento sucroenergético por meio da ampliação dos percentuais de etanol permitidos na composição dessa mistura é uma das demandas do setor. Atualmente, o mínimo exigido é 17% e o máximo permitido é 27,5%. E há, neste momento, uma janela de oportunidade para conciliar o atendimento a essa demanda com a necessidade de aceleração do processo de transição energética: o Projeto de Lei Combustível do Futuro que foi apresentado pelo governo federal e está em tramitação no Congresso Nacional. Entre outras medidas, o PL propõe um aumento desses limites para 22% e 30%, respectivamente.
E não é só a cultura da cana que tem um potencial subaproveitado quando se trata da produção de combustíveis verdes a partir de biorenováveis. Restos vegetais agrícolas e rejeitos da criação animal já são usados para a produção de biogás e biometano.
Recorrendo novamente ao paralelo com a indústria de fósseis, reproduz-se na cadeia extratora de biomassa e na obtenção de substratos orgânicos o que já se observa na do petróleo. Dessa matéria-prima original a indústria produz plásticos e combustíveis líquidos e ainda aproveita o gás natural resultante do processo original de extração do óleo. A intervenção logística é necessária apenas para canalizá-lo e assim gerar energia. Nada é desperdiçado, como lembra Amanda Duarte Gondim, coordenadora da Rede Brasileira de Bioquerosene e Hidrocarbonetos Sustentáveis de Aviação (RBQAV).
“Seguindo esse exemplo, temos também que beneficiar a biomassa ao máximo para ter maior índice de aproveitamento e maior valor agregado”, aponta, ao explicar porque a circularidade é fator essencial para que opções conhecidas tornem-se viáveis do ponto de vista econômico. “O aproveitamento de resíduos ajuda a fechar a conta ao baratear os custos de produção”, explica, em fala complementar à do representante do setor sucroenergético. “Somos favoráveis ao diesel verde e ao bioquerosene. Mas são alternativas que custam quase o dobro do biocombustível. Ainda que o melhor seja o diesel verde, ele sai pelo dobro do preço do etanol de cana”, informa Donizete.
O papel da agropecuária no mercado de biorenováveis
Mais um motivo para que a pesquisa agropecuária siga com suas investigações e descobertas. “Vai haver potencialmente uma competição por matéria-prima de origem biorenovável. E se não conseguirmos diversificar seguiremos restritos e sempre dependentes das mesmas culturas agrícolas”, assinala Alexandre Alonso, chefe-geral da Embrapa Agroenergia. E biomassa há de sobra no Brasil. Mas ao pensar nas demandas industriais, a logística é um fator de grande peso.
Pensando na instalação de novas biorrefinarias, por exemplo, é possível planejar para que estejam próximas a regiões produtoras da biomassa adotada industrialmente. Como lembra Alonso, produzir e consumir no mesmo lugar é uma das maneiras de se diminuir custos. “Nem sempre teremos matérias-primas nos locais em que as demandas surgem. Mas os esforços da pesquisa agropecuária se voltam para conhecer e aproveitar ao máximo a diversidade de espécies vegetais do Brasil, considerando, por um lado, a ocorrência natural de algumas delas em determinadas regiões, e, de outro, seus níveis de adaptabilidade a diferentes territórios”, assegura o chefe da Embrapa Agroenergia.
Retomando a ideia de circularidade, a Geo Biogás & Carbon, tornou-se, ela mesma, exemplo aplicado do conceito ao aliar o potencial do setor agropecuário com a
geração de gás eficiente. Unidades da empresa usam os subprodutos resultantes da produção do etanol para gerar tanto a energia consumida em suas instalações quanto os biocombustíveis que abastecem seus veículos. “Resíduos da produção de etanol, geram, como subprodutos, biometano e biogás. O biogás é aproveitado para a geração de energia elétrica. E o biometano, para o biocombustível veicular”, detalha Alysson Oliveira, Gerente de Pesquisa e Desenvolvimento da empresa. E, conforme destacou, em casos assim, o campo ganha duas vezes: por um lado, diminui os custos de produção ao comercializar subprodutos a partir de resíduos que seriam descartados.
Por outro lado, incrementa a produtividade da lavoura ao usar restos culturais e resíduos da pecuária para gerar biofertilizantes. “Temos experimentos que comprovam esse incremento de produtividade na lavoura da cana a partir do uso da própria palha residual, fechando perfeitamente o ciclo de sustentabilidade”, informa.
Como mostra o quadro do BNE reproduzido no início desta reportagem, que apresenta a Repartição da Oferta Interna de Energia (OIE) no Brasil em 2022, petróleo e derivados têm a maior participação no mercado interno entre as fontes não renováveis (37,5%).
Transição energética
Hoje, com a contribuição da pesquisa agropecuária, o País tem um modelo bem-sucedido que pode ser replicado para acelerar a transição energética no segmento de combustíveis. Como vimos, o setor sucroenergético é um exemplo consolidado de cadeia produtiva sustentável, eficiente e eficaz para fornecer biomassa como matéria-prima alternativa às derivadas do petróleo. Um caminho acertado para atender a demanda presente e futura do setor de transportes leves. Mas quando observamos o setor de transporte, para a aviação e navegação marítima, que demandam os chamados combustíveis verdes, a realidade é bem mais desafiadora.
Navios e aviões demandam grandes quantidades de combustível líquido. E os combustíveis verdes, como hidrogênio, amônia ou querosene são criados a partir de moléculas que precisam ser liberadas em grandes quantidades para possibilitar uma produção em larga escala. Além disso, diferente de carros de passeios, aeronaves e grandes embarcações têm uma vida útil bem mais longa, de 20 a 25 anos. Assim, está dado que a substituição de combustíveis fósseis por biocombustíveis no transporte de grande porte se dará em ritmo bem mais lento.
Além disso, há outros fatores que tornam a transição energética nesses segmentos mais complexa. É o que explica a coordenadora da Rede Brasileira de Bioquerosene e Hidrocarbonetos Sustentáveis de Aviação (RBQAV), Amanda Duarte Gondim. “A adoção de bioquerosene para promover a descarbonização desses setores é mais desafiadora porque são indústrias que demandam grandes volumes de um combustível líquido de alta capacidade energética”. Isso envolve questões logísticas, de transporte, armazenamento. E, para a pesquisa agropecuária, segundo Amanda, “o desafio tecnológico é, a partir de uma matéria-prima renovável e sustentável, obter biocombustíveis de alto poder energético”.
Já se sabe que o setor agropecuário tem soluções comprovadamente eficientes, como o biogás composto de metano e CO2 gerado a partir de resíduos do campo. “Esse biogás, ao passar por um processo específico, torna-se um gás de síntese que libera moléculas de metano e de CO2“, explica Alysson Oliveira,. “E a liberação é em grande quantidade, em volume suficiente para produzirmos hidrogênio e metanol verdes”, atesta.
Em geral, a produção de biocombustíveis de alto poder energético, como os necessários para aviões e navios, utiliza processos termoquímicos. “Mas a Embrapa tem uma grande expertise na parte biológica, com trabalhos de fotocatálise e de eletroquímica para a transformação de biomassa em combustíveis verdes”, destaca Amanda Gondim. “Ainda está em desenvolvimento, mas precisamos impulsionar essas áreas para que lá na frente tenhamos uma gama maior e bem diversa de opções”, recomenda. E, por isso, acredita ser essencial haver total apoio à Embrapa em seu trabalho de descobrir mais e melhores fontes de biomassa entre as culturas agrícolas para prover as demandas da indústria por biocombustíveis.
Embora no Brasil ainda existam lacunas, principalmente, em termos de regulamentação e efetividade de normativos, para Alysson Oliveira, “é possível fazer agora escolhas de baixo nível de carbono, pois se trata de um mercado extremamente desenvolvido”. Entre dados de um estudo de 2019 ele cita a seguinte estimativa: a produção potencial de biogás no Brasil, somente a partir de bioresíduos agropecuários, seria suficiente para substituir até 40% da energia elétrica consumida
anualmente no país. “E isso considerando apenas resíduos do setor sucroenergético, de agroindústrias e de saneamento. Ou seja, sem competição com as culturas agrícolas fornecedoras de biomassa”.
Brasil tem grande potencial na produção de combustível sustentável
É com base em estimativas como essa que o gerente de PD&I da Geo Biogás & Carbon acredita que o Brasil pode ser um grande provedor de combustível sustentável de aviação para o mundo, contribuindo para superar parte das dificuldades que esse setor enfrenta na busca pela descarbonização. Resíduos da agropecuária são comprovadamente fontes renováveis eficientes para a produção de biogás, como comprovado pelo modelo praticado na empresa onde atua. E são recursos de que o Brasil dispõe em grande quantidade, situação privilegiada e equiparável a de poucos países do mundo.
O Brasil é uma incontestável potência agropecuária mundial. E, como bem lembra o diretor-presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (UNICA), Evandro Gussi, “a agricultura é o único setor produtivo que além de sequestrar carbono tem capacidade de gerar soluções para evitar aumento das emissões”. Mais de 12 milhões de produtores estão vinculados à UNICA por meio de 32 associações que a compõem. Juntos, são responsáveis pela produção anual de 57 milhões de toneladas de cana no Brasil. Segundo dados apresentados por Evandro, 40% deste montante estão nas mãos de produtores e 60% na de usinas. “O desenvolvimento, pela pesquisa, de variedades de cana com melhores teores para a produção de etanol de segunda geração é muito importante para o nosso segmento”, fez questão de destacar. “E o Brasil pode conquistar fatias do mercado internacional ao internacionalizar esse know how científico”, opina.
Painel debate potencial de descarbonização de biocombustíveis
As falas, opiniões, dados e perspectivas dos especialistas e representantes de diferentes segmentos da cadeia produtiva agro energética no Brasil foram apresentados no painel Transição energética e potencial de descarbonização dos biocombustíveis, realizado no dia 25/10, como parte da programação do VII Encontro de Pesquisa e Inovação da Embrapa Agroenergia (VII EnPI). O evento presencial aconteceu em Brasília (DF) ao longo de três dias. É organizado pela Unidade da
Embrapa criada exatamente para estabelecer uma ponte para viabilizar o fluxo constante entre a pesquisa agropecuária e a indústria de produção de energia renovável em suas diferentes vertentes.
Entre as soluções resultantes das pesquisas da Embrapa Agroenergia estão exatamente biocombustíveis e bioprodutos, além de modelos para o processamento e beneficiamento de matérias-primas de origem animal e vegetal.
Na carteira de projetos da Unidade, 35% são desenvolvidos em parceria com setor produtivo”, destacou Bruno Galvêas Laviola, chefe-adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Agroenergia, mediador do painel Tecnologias da Embrapa, realizado no dia 25 de novembro. Inovações tecnológicas desenvolvidas pela empresa com trajetórias mercadológicas bem-sucedidas foram o fio condutor das falas dos palestrantes desse tema.

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Estratégia simples e de baixo custo otimiza a adubação em solos de alta fertilidade
Pesquisa em MG mostra que a adubação de restituição mantém a produtividade, reduz custos e evita excessos de nutrientes em áreas consolidadas do Cerrado.

Uma pesquisa realizada durante três safras (seis cultivos), em Unaí (MG), aferiu e validou a adubação de restituição associada ao balanço de nutrientes, para maior eficiência e economia no uso de fertilizantes na produção de culturas anuais em solo de Cerrado com fertilidade construída. Adubação de restituição é a prática de repor no solo nutrientes que são exportados nos produtos colhidos das lavouras.
As estratégias propostas pela pesquisa mostram que é possível o ajuste do aporte de nutrientes das adubações, de forma alinhada à utilização consciente dos insumos agrícolas e à conservação dos recursos naturais, contribuindo, ainda, para reduzir a pegada de carbono e aumentar a eficiência energética nos processos de produção.
Antecedentes para o estudo
A pesquisa considerou a premissa de que as culturas anuais apresentam elevada demanda de Nitrogênio (N), Fósforo (P) e Potássio (K), levando ao consumo de grandes quantidades de fertilizantes, para suprir os sistemas de produção brasileiros que envolvem os cultivos de soja, milho, algodão, feijão, trigo e sorgo. A demanda por esses nutrientes, para manter a produtividade, representa parte expressiva dos custos das lavouras, um dos principais fatores de risco econômico da agricultura do País.
Outro aspecto é que, muitas vezes, mesmo sabendo que o solo já tem alta fertilidade, com disponibilidade de nutrientes acima dos níveis críticos, o agricultor se sente mais seguro quando realiza as adubações que já vinha utilizando por vários anos. Porém, tem sido reportado, em várias publicações, que os solos em áreas de cultivo consolidado do Cerrado acumularam considerável estoque de nutrientes com o passar do tempo, superando a condição de baixa fertilidade original.
Experimentação em fazenda
Os principais tratamentos, comparados em parcelas de grandes dimensões, num talhão de produção comercial com histórico de longo prazo em plantio direto e solo com fertilidade construída, envolveram: 1) a adubação de restituição de N, P e K exportados nas colheitas; 2) o manejo padrão da fazenda; e 3) um controle sem adubação NPK. “As avaliações foram realizadas durante três ciclos safra/segunda safra, com soja/milho (ou sorgo), em sistemas com ou sem braquiária em consórcio”, detalha o pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo Álvaro Vilela de Resende, que coordenou o estudo.
Resultados práticos
Os resultados, segundo Resende, permitiram constatar que a adubação (ou a ausência dela) não influencia a produtividade da soja, sendo o nitrogênio o fator que mais limita o rendimento do milho, nas condições do talhão estudado. O consórcio com braquiária na segunda safra pode prejudicar o sorgo e não afeta o milho, mas aumenta a produtividade da soja subsequente. “Verificou-se que a adubação de restituição vinculada ao balanço de nutrientes mantém os níveis de produtividade e de rentabilidade, com uso mais eficiente de fertilizantes, enquanto preserva a fertilidade do solo. Assim, é uma estratégia de manejo nutricional inteligente para solos de fertilidade construída, ao prevenir déficits ou excedentes de nutrientes, contribuindo na busca por desempenho produtivo com sustentabilidade ambiental”.
Para o pesquisador essas conclusões, de certa forma, já eram esperadas, tendo em vista os resultados de pesquisas anteriores, envolvendo experimentação em outras regiões e propriedades agrícolas no Cerrado, onde frequentemente tem-se observado pouca ou nenhuma resposta à adubação com nutrientes como P e K, sobretudo em solos argilosos. “Mas faltavam elementos mais concretos para convencer definitivamente os produtores e técnicos, de que é necessário e possível melhorar o dimensionamento das adubações de manutenção”, explica Resende.
“Ainda persiste a tendência de se utilizarem fertilizantes sempre nas mesmas formulações ou quantidades fixas de N, P e K, recorrentemente, apesar do notável avanço tecnológico e do incremento no potencial produtivo dos ambientes agrícolas no Cerrado. Além disso, em geral, os produtores não se atentam em calcular o balanço de nutrientes, por desconhecerem o valor dessa informação”, complementa o pesquisador Miguel Marques Gontijo Neto.
De acordo com Resende, o manejo apropriado para solos de alta fertilidade busca dimensionar as quantidades de nutrientes para fornecer apenas o necessário à reposição do que é exportado na colheita, mais eventuais perdas do sistema. “A estratégia de se adotar a adubação de restituição conjugada com o cálculo do balanço de nutrientes, ao longo do tempo, compatibiliza o suprimento às quantidades realmente demandadas pelo sistema de culturas. O monitoramento se completa com a análise de solo, para acompanhar como a fertilidade oscila em função desse manejo. Assim, com a junção de técnicas simples e de baixo custo, evitam-se situações de falta ou excesso de nutrientes, com ganhos de eficiência no uso de fertilizantes”.

Áreas agrícolas consolidadas em plantio direto e solos de fertilidade construída permitem ajuste fino das adubações
Embora não seja propriamente uma novidade, a solução validada no estudo viabiliza o dimensionamento das adubações de forma precisa e específica por talhão, podendo inclusive ser automatizada conforme o aparato de informática e equipamentos já disponíveis em muitas fazendas. O objetivo é ajustar o aporte de nutrientes sempre que necessário, ao longo de uma sequência de cultivos, e está alinhado à crescente necessidade de utilização consciente dos insumos agrícolas e à conservação dos recursos naturais.
“São comuns situações de desequilíbrio entre as quantidades de nutrientes adicionadas via adubação e as removidas nos produtos colhidos das lavouras. O balanço desfavorável ao longo do tempo prejudica a produtividade quando há déficit, ou leva ao desperdício de fertilizantes quando há excedente de nutrientes. Além de resultarem em perda de rentabilidade, ambas as situações também podem implicar maior pegada de carbono do produto colhido. Portanto, a estratégia proposta na publicação também pode contribuir para maior eficiência energética e neutralidade ambiental nos processos de produção em áreas de agricultura consolidada no Brasil”, conclui Álvaro Resende.
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Seguro rural para soja no Paraná adota modelo inédito baseado em manejo
Projeto-piloto do ZarcNM oferece subvenções maiores conforme o nível de manejo, incentivando práticas que reduzem riscos de perdas por seca e aumentam a resiliência da cultura.

O Zoneamento Agrícola de Risco Climático em Níveis de Manejo (ZarcNM) começou a ser operado pela primeira vez no Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) do Ministério da Agricultura e Pecuária. A nova modalidade está em fase piloto, tendo como foco inicial a cultura da soja no Paraná. Vinte e nove áreas de produção, totalizando cerca de 2.400 hectares, aderiram à iniciativa e efetivaram a contratação de seguro rural, acessando percentuais diferenciados de subvenção nas apólices de acordo com o nível de manejo adotado na propriedade.
O piloto usa a metodologia desenvolvida pela Embrapa, que permite classificar talhões em quatro níveis de manejo (NM), baseada em indicadores objetivos, verificáveis e auditáveis. Juntamente com as avaliações de risco climático do ZarcNM, o produtor e demais interessados podem verificar o quanto a adoção de boas práticas pode reduzir os riscos potenciais de perdas da produção por seca. Quanto melhor o nível de manejo, maior a subvenção do seguro.

Fotos: Shutterstock
Da área total participante do projeto-piloto, cerca de 5% foi classificada com o nível quatro, o melhor da escala do ZarcNM e que resulta numa subvenção de 35% no valor do seguro rural. Do restante, 27% da área foi classificada no nível de manejo 3, com subvenção de 30%; 57% no nível 2, com 25% de subvenção da apólice; e 11% da área ficou com o nível 1, mantendo os 20% de subvenção padrão do PSR.
De acordo com Diego Almeida, diretor do Departamento de Gestão de Riscos, do Ministério da Agricultura, este novo formato de subvenção deve se tornar perene. “Após a avaliação dos resultados desta primeira fase, planejamos expandir o programa para outros estados, iniciando com a soja e, posteriormente, incluindo a cultura do milho”, afirma.
Aumento de produtividade e resiliência
A metodologia ZarcNM contribui para reduzir um problema recorrente do seguro rural que é a necessidade da quantificação mais individualizada do risco, por gleba ou talhão, conforme o manejo de cada área. Ao aplicar incentivos financeiros, a gestão do PSR coloca em prática um mecanismo de indução de boas práticas e adaptação da agricultura brasileira, tornando-a mais resiliente à variabilidade climática e aos crescentes riscos de seca.
O pesquisador José Renato Bouças Farias, da Embrapa Soja (PR), afirma que essa atualização do ZarcNM é muito relevante porque quanto melhor o nível de manejo adotado, menor será o risco de perdas por déficit hídrico. De acordo com o pesquisador, a adoção de práticas conservacionistas é determinante para aumentar a infiltração de água e reduzir o escorrimento superficial, comuns durante chuvas intensas e em grandes volumes. Junto a outras práticas de manejo do solo, elas promovem maior disponibilidade de água às plantas. “O aprimoramento do manejo do solo leva a um aumento significativo na produtividade das culturas, à redução do risco de perdas causadas por condições de seca e ao aumento da fixação de carbono no solo. Além disso, promove a conservação tanto do solo quanto dos recursos hídricos”, destaca Farias.
Segundo o pesquisador, culturas não irrigadas, como a grande maioria da área com soja no Brasil, têm como fontes de água para atendimento de suas necessidades a água da chuva e aquela disponibilizada pelo solo. “As práticas de manejo que incrementam a capacidade do solo de disponibilizar mais água às plantas são essenciais para reduzir os riscos de perdas por seca, principalmente, quando se projetam cenários climáticos cada vez mais adversos à exploração agrícola”, ressalta Farias.
Modelo de operação
Neste modelo testado pela primeira vez são considerados seis indicadores: tempo sem revolvimento do solo, porcentagem de cobertura do solo em pré-semeadura (palhada), diversificação de cultura nos três últimos anos agrícolas, percentual de saturação por bases, teor de cálcio e percentual de saturação por alumínio. “Além dos indicadores quantitativos, alguns pré-requisitos precisam ser observados como, por exemplo, semeadura em contorno ou em nível”, explica Farias.
No piloto, os agricultores submetem seus projetos às seguradoras e agentes financeiros, indicando o talhão a ser analisado, repassando as informações solicitadas e as análises de solo feitas em laboratórios credenciados. Por meio de uma plataforma digital desenvolvida pela Embrapa Agricultura Digital (SP), o Sistema de Informações de Níveis de Manejo (SINM), os dados são cruzados com informações de sensoriamento remoto para cálculo e classificação dos níveis de manejo.
O pesquisador da Embrapa Agricultura Digital e coordenador da Rede Zarc de Pesquisa, Eduardo Monteiro, destaca a importância do sensoriamento remoto nesse processo. Ele exemplifica com uma das áreas aprovadas no Nível de Manejo 3 e que está ao lado de outra com sinais de erosão.
“Apesar de vizinhas, as classificações podem ser bem diferentes. A área erodida não obteria classificação maior que NM1. Isso mostra a importância de um sistema de verificação independente e bem estruturado para ser capaz de observar esses detalhes de forma automatizada à medida que ganha escala e o número de operações chega aos milhares”, afirma.
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Brasil e África discutem novas revoluções verdes para agricultura sustentável
Painel promovido pelo ATLAS na AgriZone destaca cooperação técnica, políticas públicas e transferência de tecnologia como caminhos para acelerar transformações agrícolas no clima atual.

Com a crescente demanda global por práticas agrícolas sustentáveis, os debates sobre novas revoluções verdes tornam-se cada vez mais essenciais. Nesse contexto, o Laboratório de Transições Agrícolas para Soluções Africanas (ATLAS) promoveu, nesta terça-feira (18), na AgriZone, o painel “Lições das Revoluções Verdes: Perspectivas do Brasil e da África para Transformações Agrícolas Sustentáveis”.
O assessor especial da Secretaria-Executiva do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), José Polidoro, representou a Pasta no painel e destacou que o sistema agrícola brasileiro é baseado em três pilares: ciência e tecnologia, defesa agropecuária e o sistema de financiamento/crédito rural. “Não temos dúvida em afirmar que nossa agricultura é baseada em ciência sustentada por tecnologia. E temos um amplo sistema para financiar grandes e pequenos produtores. Todos os produtores no Brasil são atendidos por esse sistema, que financia produção, custeio e investimentos”, disse.
A plataforma ATLAS busca promover o diálogo político, a cooperação institucional e a ampliação de financiamentos para o desenvolvimento agrícola sustentável do continente africano. O painel discutiu as políticas públicas que tornaram o Brasil uma potência agrícola global, incluindo a recuperação de solos degradados e tecnologias adaptadas aos diferentes biomas brasileiros.
O continente africano possui 70% da sua força de trabalho envolvida na agricultura, e o evento buscou explorar caminhos de cooperação entre Brasil e África capazes de acelerar uma transformação agrícola compatível com o clima.
Polidoro citou como exemplo o Programa Caminho Verde Brasil, que irá impulsionar o crescimento da agropecuária brasileira por meio da restauração de áreas degradadas. “Temos uma política que demonstra aos nossos parceiros do Sul Global, como os países africanos, que é possível realizar uma revolução verde, uma revolução verde verdadeira. Mas, para isso, é necessário ter leis, regulamentação e políticas de Estado”, ressaltou.
Brasil e África firmaram, em 2025, acordos para a transferência de tecnologia por meio da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), além da assinatura de Memorandos de Entendimento (MoUs) entre o Brasil e países africanos para cooperação técnica, melhoria dos sistemas agrícolas e apoio à segurança alimentar e ao desenvolvimento rural.
Participaram do painel o pesquisador PhD em Agronomia, Genética e Cooperação Internacional da Embrapa, Paulo Melo; o chefe de Resiliência, Clima e Fertilidade do Solo da Aliança para uma Revolução Verde na África (AGRA), Tilahun Amede; e a diretora de Relações Públicas da OCP Nutricrops, Mouna Chbani.





