Suínos Aurora Alimentos
Logística gera perdas e pandemia agravou essa situação para agroindústria
“É de extrema importância que o governo olhe um pouco para o cenário econômico do transporte, da infraestrutura. Essa questão do combustível precisa ser tratada, porque infelizmente quem acaba pagando a conta é o consumidor. A atuação do governo, na questão de entregar uma infraestrutura coerente para termos mais produtividade e reduzir a burocracia para tornarmos mais eficientes é o caminho”. A informação é de Celso Cappellaro, gerente de Operação da Cooperativa Central Aurora Alimentos, um dos maiores conglomerados de produção de alimentos do Brasil.
Em entrevista exclusiva ao jornal O Presente Rural, Celso Cappellaro destaca ainda as dificuldades que o Brasil tem enfrentado em outras áreas da logística, como a falta de contêineres e até mesmo a falta de navios para levar a produção da empresa para o exterior. Atualmente, 40% de tudo que é produzido pela Aurora abastece países ao redor do mundo. Como essa engrenagem de distribuição está ‘enferrujada’, os custos têm ficado ainda maiores.
O Presente Rural – Como é feita a logística para entrega de matéria-prima nas fazendas produtoras de aves e suínos?
Celso Cappellaro – Hoje as fábricas de rações são da Aurora ou são das cooperativas filiadas. Com o objetivo de ter segurança no processo de produção toda a ração dos suínos que são abatidos dentro da Aurora (porque aí a gente tem controle de toda a matéria-prima) são produzidas dentro da Aurora. Farelo, milho, nutrientes etc. São todas ou da fábrica de ração da Aurora ou das fábricas de rações das cooperativas filiadas. Aí toda a logística de caminhões para entrega da ração é 100% vinculada com contrato da Aurora ou da cooperativa filiada.
O Presente Rural – Como é feita a logística das granjas até as indústrias?
Celso Cappellaro – Hoje todos os suínos e principalmente todas as aves também são vinculados aos produtores que são sócios das cooperativas. Então, ou a Aurora ou as cooperativas têm todo o acesso às informações dos produtores. Onde estão localizados por georreferenciamento e todos os animais são feitas programações de 10 a 15 dias antes, por nós mesmos, porque temos a informação dos lotes que estão no campo, tanto de suínos como de frango. Quando estão aptos para serem abatidos a gente faz a programação e os caminhões que vão buscar os animais. Esses veículos são adequados para atender a questão do bem-estar animal e todos esses transportadores têm vínculo com a Aurora e são exclusivos para essa atividade, tanto quem leva as rações quanto quem busca os animais.
O Presente Rural – Em sua avaliação como está o estado de conservação das estradas rurais e das rodovias que levam às agroindústrias?
Celso Cappellaro – As estradas vicinais vêm evoluindo, mas infelizmente ainda é bem diferente da Europa e Estados Unidos, por exemplo, onde todas as estradas vicinais do interior têm algum tipo de pavimentação, seja qual for, aqui no Brasil ainda não. E com condições de relevo da nossa região fica mais complicado. Então, principalmente depois de uma enxurrada, as nossas estradas são precárias. Certamente se nós tivéssemos rodovias vicinais, inclusive as estaduais e, principalmente as federais, mas pensando buscar nas propriedades as estaduais e municipais numa condição melhor certamente a nossa produtividade em termos de condições de logística aumentaria no mínimo de 20 a 30%.
O Presente Rural – Qual seria a logística ideal para essa fase do sistema produtivo?
Celso Cappellaro – Aqui na região a gente é um cluster – um case de sucesso – porque o sistema de integração está muito voltado aqui. Acredito que justamente as condições e recursos para que tenhamos uma estrutura de rodovias mais qualificadas, com uma infraestrutura melhor para termos essa produtividade melhor. Certamente teríamos custos de manutenção menor, custos logísticos menores como um todo e, com essa produtividade de 20 a 30% maior, nós conseguiríamos ser mais competitivos no mercado.
O Presente Rural – Como é feita a distribuição de alimentos para o Brasil? Quais os principais gargalos?
Celso Cappellaro – Todos os nossos carregamentos, também de frigorificados, são divididos em duas etapas. A primeira que chamamos de primária que é tirar o produto das indústrias e levar até os centros de distribuições nos grandes centros, para onde serão distribuídos, e a secundária, que seria a segunda perna da entrega, que vai dos centros de distribuições dos grandes centros até o consumidor final. A primária é feita com carretas de capacidade máxima, de 28 mil a 30 mil toneladas e os veículos menores para agilizar a entrega dentro dos centros urbanos para fazer a distribuição no varejo e atacado. E também todos esses veículos são de terceiros com contrato específico para transportar os produtos da Aurora, atendendo todas as premissas de questão de conservação da qualidade do produto, temperatura, entre outras questões. São caminhões que precisam atender a questão de que estão transportando alimentos e precisam ser muito bem conservados.
O principal gargalo inicial para nós se chama (BR) 282 e interseção (BR) 470, que liga ao nosso litoral. É a única rodovia que é um eixo que liga o Oeste ao Leste do Estado. Hoje como o grande centro consumidor está localizado no Sudeste (do Brasil), onde temos a via (BR) 282 e a (BR) 153 que leva até o Sudeste. Esse é um dos principais gargalos que a gente tem que também aumentaria em 20% a produtividade, se nós tivéssemos, por exemplo, essas duas rodovias duplicadas.
O Presente Rural – Como é feita a distribuição para o exterior? Quais os principais gargalos?
Celso Cappellaro – Hoje, em torno de 40% da produção da Aurora vai para o exterior. Desses 40%, a maioria dos nossos produtos são produzidos no Oeste de Santa Catarina, vão pela (BR) 282 interseção a (BR) 470 – para Itajaí ou Navegantes – os principais portos que usamos. O terceiro porto é o de Itapoá. Por isso, que essa rodovia 282 com intercessão da 470 é imprescindível a duplicação, para termos 20% a mais de produtividade com os nossos caminhões. Se, por exemplo, você se pegar principalmente a região de Blumenau, subida da serra, e ficar atrás de um caminhão que não tem aonde ir, você perde muito a produtividade. Todos os nossos carregamentos para exportação são pegos os contêineres nos portos, junto aos nossos parceiros que transportarão via marítima, ou seja, pega o contêiner, coloca em cima de uma prancha de caminhão, ele vem vazio até a fábrica, nós carregamos e ele vai de novo para o porto, onde é retirado o contêiner e depois tem a capacidade de retornar para fazer uma nova viagem.
O Presente Rural – Cerca de 40% das cargas brasileiras de frangos e suínos estão paradas em portos, de acordo com a ABPA. Isso é normal? Por que está acontecendo?
Celso Cappellaro – Não é normal, muito pelo contrário, isso está afetando o nosso processo produtivo. Os portos estão extremamente lotados porque a engrenagem que rodava o mundo na questão do frete marítimo teve uma mudança com o processo da pandemia. Inicialmente tivemos falta de contêineres. Hoje há falta de navios, porque houve uma migração das rotas dos navios que faziam uma rota pela América do Sul, Ásia e América Central. E hoje mudou isso. As empresas que fazem o transporte marítimo transferiram esse tráfego porque diminuiu o volume de importação da China para essas regiões. Tudo isso quebrou a engrenagem da roda. E até ter esse ajuste estão dando esses problemas. Ficaram bastantes navios entre Estados Unidos e China e deixando a América do Sul um pouco de fora.
O Presente Rural – Quais os prejuízos que essas cargas paradas representam?
Celso Cappellaro – Em termos de qualidade do produto não há prejuízo. O que acontece é que dependendo da situação, quando você tem o direito junto ao contrato que você faz com o transportador que é o dono do contêiner (armador) ele dá, por exemplo, 10 dias para ficar com o contêiner. Se passar esses dias você começa a pagar diárias, então começa a ter custos inerentes ao processo logístico dentro desse contexto. É aumento de custo de forma significativa. Isso só a questão dos contêineres parados, sem contar que a quebra da engrenagem das rotas de navio fez com que o frete disparasse.
O Presente Rural – Qual é o tempo considerado ideal para uma carga deixar a indústria até ser embarcada em navios?
Celso Cappellaro – Em função da questão de atender documentações o ideal é na faixa de 7 a 10 dias.
O Presente Rural – A empresa tem sentido falta de contêineres ou navios?
Celso Cappellaro – Ainda não está solucionado o problema do contêiner, mas hoje o principal gargalo é a fata de rotas de navios para poder carregar esses contêineres.
O Presente Rural – Após o processamento dos alimentos qual seria o cenário de logística ideal?
Celso Cappellaro – Quando todo mundo vai bem, tudo flui naturalmente. No mercado interno que melhorasse o poder aquisitivo, porque se você tem uma redução no seu consumo, automaticamente tem que guardar produto em terceiro, você começa a quebrar o fluxo normal do consumo. Você produz, transporta e consume! Quando você não tem essa engrenagem alinhada, você produz, estoca ou dentro de casa ou em terceiro, criando um custo maior dentro do processo. Então, o ideal é melhorar o poder aquisitivo do mercado interno para ter mais consumo de proteína e ter uma organização com a redução da pandemia e que volte o turismo. Por exemplo, no Oriente Médio, que compra bastante carne de frango, agora está voltando à normalidade da compra, principalmente de peito de frango, porque começou a aumentar o turismo. O importante é que o mundo volte a uma normalidade dentro do seu processo pós-pandemia.
O Presente Rural – Como a logística influencia na competitividade do agronegócio brasileiro?
Celso Cappellaro – A logística é como as veias do corpo humano que leva o produto de um lado para o outro e ela é impactada justamente pela pulsação do mercado. Quanto mais pulsação mais a logística flui. No momento em que diminui a circulação dentro do processo, a logística também é impactada. Por exemplo, o cenário dos custos que quebrou toda a engrenagem desde a fabricação de caminhão, combustível, fabricação de pneus, manutenção… Hoje quando um transportador compra um caminhão leva seis meses para recebê-lo porque não tem peças para suprir e fazer a entrega. Houve uma quebra de engrenagem. Tudo isso fez com que os custos logísticos subissem de forma absurda – uma quebra de fluxo normal dentro do processo de produção, logística e consumo.
O Presente Rural – O que a companhia tem feito para ter uma logística mais eficiente?
Celso Cappellaro – Nós temos procurado ser eficientes dentro dos nossos processos operacionais, deixando os caminhões cada vez menos parados dentro das nossas plantas, dando produtividade a eles. Temos algumas estratégias também no intuito de tentar mitigar custos para o nosso transportador e, principalmente, sermos eficientes operacionalmente porque grande parte dos custos de logística dependem também da parte externa, que são os custos de combustíveis, infraestrutura do governo e caminhões que vem de outras empresas e que nesse momento existe uma ruptura.
Aurora amplia exportações em receita e volume
A Cooperativa Central Aurora Alimentos – terceiro grupo agroindustrial brasileiro do segmento de carnes – desenvolve acelerado incremento nas exportações, iniciado em 2020 e consolidado neste ano. No ano passado, as exportações da Aurora cresceram 61,8% em receitas e 23% em volumes. As compras chinesas de proteína animal no mercado mundial catapultaram as vendas da Aurora, potencializadas pela situação cambial: o dólar valorizado frente ao real ampliou os ganhos pelo câmbio e valorizou ainda mais os produtos de exportação. A China, sozinha, ficou com 40% das exportações totais da Cooperativa Central.
Com esses resultados, a importância relativa da cooperativa no cenário das vendas brasileiras ao exterior cresceu: em 2020, a Aurora respondeu por 17,5% das exportações de carnes suínas do Brasil e por 6,6% das exportações de frango. Anteriormente era, respectivamente, 16,8% e 6,4%.
O presidente Neivor Canton e o diretor comercial Leomar Somensi mostram que o desempenho do primeiro semestre deste ano confirma essa escalada. Nos primeiros seis meses de 2021 foram exportadas 291,5 mil toneladas de carne e derivados, o que representa um crescimento de 18% sobre o mesmo período do ano anterior. Em volumes, 55% é composto por proteína de frango e 45% de suíno.
Em receitas cambiais, as exportações desse primeiro semestre renderam R$ 667,8 milhões de carne e derivados, que representa um crescimento de 23% sobre o mesmo período do ano anterior. As vendas de carne de frango contribuíram com 40% para esse resultado e, as carnes suínas, com 60%.
Os principais produtos exportados, em carne suína, foram pernil, lombo, carré, paleta, barriga, costela e demais cortes/miúdos. Os principais importadores são China, Hong Kong, Chile, Estados Unidos e Japão.
As carnes de frango mais exportadas pela Aurora Alimentos foram coxas e sobrecoxas, peito, asas e demais cortes/miúdos, tendo como principais destinos China, Japão, Emirados Árabes, Filipinas, Rússia e Coreia do Sul.
As vendas de carnes suínas no mercado externo ainda se beneficiam dos influxos da demanda chinesa que se manteve forte. O surgimento de novos focos de peste suína na China, Rússia e outros países asiáticos, principalmente, contribuiu para o escoamento da produção. A China continuou o principal mercado.
O mercado de carnes de aves foi impactado pela mudança da sazonalidade climática (com a chegada do verão no hemisfério norte) associado ao surgimento de focos de gripe aviária na Europa e na Ásia. Esses fatores favoreceram o esforço de busca de recuperação de preços e as exportações brasileiras de frango.
O diretor comercial avalia como “muito positivo” o balanço das exportações do primeiro semestre, “apesar dos elevados custos dos insumos (milho e farelo de soja) e do protecionismo de alguns mercados”.
Da mesma forma, as expectativas para o segundo semestre são otimistas. “Há sólidas previsões de aumento do consumo decorrente do avanço da vacinação e da retomada gradual do turismo. Os custos de produção, contudo, irão se manter elevados, pressionando a reposição dos preços e a retração das margens,” analisa Leomar Somensi.
Mas o cenário também comporta desafios, lembra o presidente Canton. A avicultura e a suinocultura industrial enfrentam, neste ano, o violento encarecimento dos insumos e, em especial, da alta sem precedentes no preço dos grãos (milho, farelo de soja etc.) e de embalagens, entre milhares de outros itens. “O desafio é manter a competitividade de toda a cadeia produtiva, especialmente dos milhares de produtores rurais”, assinala.
Desempenho Anual
O presidente Neivor Canton prevê que, em se mantendo os volumes médios mensais faturados, a expectativa é de encerrar o exercício com um crescimento no negócio aves em faturamento na ordem de 15%, sendo 24% de acréscimo no mercado externo e 3,3% no mercado interno. No negócio suínos, a previsão é de finalizar o ano com um crescimento em faturamento na ordem de 20%, sendo 40% de acréscimo no mercado externo e 6% no mercado interno.
Suínos
Forte alta do suíno vivo eleva poder de compra frente ao milho pelo 8º mês
Pesquisadores do Cepea explicam que esse cenário decorreu das altas de preços do suíno vivo superiores às verificadas para os principais insumos utilizados na atividade – milho e farelo de soja, comparando-se as médias de agosto e setembro.
O poder de compra de suinocultores paulistas frente ao milho cresceu pelo oitavo mês seguido, conforme apontam levantamentos do Cepea.
Em relação ao farelo de soja, setembro foi o terceiro mês consecutivo de aumento no poder de compra.
Pesquisadores do Cepea explicam que esse cenário decorreu das altas de preços do suíno vivo superiores às verificadas para os principais insumos utilizados na atividade (milho e farelo de soja), comparando-se as médias de agosto e setembro.
Na região SP-5 (Bragança Paulista, Campinas, Piracicaba, São Paulo e Sorocaba), o suíno vivo foi negociado ao valor médio de R$ 8,95/kg em setembro, forte aumento de 5,8% em relação ao de agosto.
Inclusive, este foi o quinto mês seguido de valorização, de acordo com levantamento do Cepea.
Suínos Em Pato Bragado
Biogás diminui custos de produção e gera renda para suinocultores no interior do Paraná
Sistema instalado na granja da família Fincke solucionou o problema de dejeto dos animais e hoje mantêm a propriedade com a energia de biogás.
Quem vê a propriedade da família Fincke, em Pato Bragado, na região Oeste do Paraná, não imagina a dor de cabeça que eles tinham até pouco tempo atrás. Comandada por Carlito Fincke e os filhos Adilson e Jonas, os 30 alqueires de terra são divididos entre a produção de suínos, principal atividade, e as lavouras de soja e milho.
A suinocultura havia se tornado quase inviável na propriedade, devido aos custos elevados e questões ambientais. Até que eles encontraram uma solução: gerar a própria energia. A história da família Fincke, seus desafios e soluções, é tema da reportagem desta semana da série especial “Paraná, a Energia Verde que Renova o Campo”, produzida pela Agência Estadual de Notícias (AEN) e publicada às terças-feiras.
A família de produtores de Pato Bragado é mais um exemplo cabal do impacto que o apoio do Governo do Estado tem para os produtores e para o meio ambiente. O apoio se dá com programa RenovaPR, que subsidia o custo financeiro dos investimentos em equipamentos como biodigestores e painéis fotovoltaicos, a fim de incentivar e disseminar a energia limpa no campo. “Instalamos biodigestor e, assim, solucionamos o problema de dejeto dos animais, minimizamos o cheiro e as moscas, e estamos ganhando dinheiro, mantendo a propriedade também com a energia de biogás. Foi um salto muito grande nessa parte, além do meio ambiente. Temos que nos preocupar com os gases que a gente está lançando. Temos que ter consciência de ajudar”, afirma Adilson.
A atividade da família na produção de suínos começou com o pai em 2009 e logo cresceu com a entrada dos filhos no negócio, passando de 300 para sete mil suínos, distribuídos em seis granjas. Entretanto, à medida que o número de animais crescia, os problemas também aumentavam.
Os Fincke lidam com o suíno na sua fase final. A Unidade de Terminação (UT), como é denominado esse estágio, é o local em que os porcos chegam com cerca de 60 dias de vida e peso médio de 23 quilos (kg), e permanecem até alcançarem o peso de 120 kg, em um período de 120 dias de alojamento. Dali eles seguem para o frigorífico.
Durante quatro meses, os animais crescem, engordam, e com isso vem o obstáculo que acomete todo suinocultor: os dejetos. Adilson,
filho mais velho de Carlito, conta que os três tanques de esterco que existem na propriedade, hoje desativados, não davam conta de todo o material. “Quando chegamos nesses sete mil suínos percebemos que estávamos com problema. Chegamos a pagar para os vizinhos receberem esse dejeto porque não tínhamos o que fazer”, ressalta Adilson. “Fora o problema de carcaças. Às vezes chegávamos a enterrar os animais porque a composteira sempre estava cheia, não dava conta, além dos problemas de cheiro e de moscas”.
Foi então que um familiar deu a ideia. “Um tio chegou para nós e disse: ‘vocês estão perdendo dinheiro, deviam fabricar energia com toda essa matéria-prima’. Aí acendeu uma luz”, lembra o produtor. A luz a qual ele se refere era a produção de biogás, por meio de um biodigestor, resolvendo o problema de dejetos, uma vez que ele é transformado em gás, gerando energia, e o líquido, que também passa por um tratamento, transforma-se em biofertilizante para irrigação da lavoura.
Ideia aprovada pelos filhos, o próximo passo foi convencer o pai, relutante com o custo do investimento. “Quando fui ver o valor, meu pai já botou pedra. ‘Você não vai pegar R$ 700 mil para fazer um biodigestor e se aventurar’. Conversei com uma empresa que deu a ideia de tentarmos pelo RenovaPR, com juro zero”, lembra Adilson. “Deu certo, conseguimos nos enquadrar, convenci meu pai e começamos o projeto.”
RenovaPR
O Paraná Energia Rural Renovável (RenovaPR) foi criado pelo Governo do Estado com o objetivo de incentivar a produção de energia limpa e sustentável no campo. Desde 2021, ano de criação do programa, já foram mais de 26 mil usinas fotovoltaicas e ou de biogás instaladas.
Por meio de subsídio da taxa de juros, via Banco do Agricultor Paranaense, operacionalizado pela Fomento Paraná, o Estado banca parte ou a integralidade dos juros do financiamento para instalação de fontes de energia renováveis, como solar e biogás, no meio rural. É uma forma de baratear o custo da produção e contribuir para a preservação do meio ambiente. Além disso, o aproveitamento de dejetos de animais para produção de biogás, reduz a emissão de gases altamente poluentes no ar ou a contaminação do solo e de lençois freáticos, por exemplo.
O coordenador de Energias Renováveis no Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-Paraná), Herlon Almeida, ressalta que o objetivo do Estado é incentivar cada vez mais a instalação de biodigestores como forma de reduzir a emissão de poluentes no ar, gerar energia limpa, reduzir custos para quem produz e ainda acabar com os dejetos, obstáculo que mais afeta os produtores de animais, sejam suínos, bovinos ou aves. “O Governo do Paraná incentiva o biogás mais do que qualquer outra energia renovável porque, ao se fazer biodigestão, é realizado um tratamento, uma adequação ambiental, pois trata dejetos que normalmente impactam o meio ambiente e os transforma em riqueza, que é a energia do biogás, do biometano e, ainda, o digestato, que é o resíduo que sobra após a biodigestão e que pode ser convertido em fertilizante para uso agrícola”, explica Almeida.
Cenário do biogás
De acordo com levantamento do Centro Internacional de Energias Renováveis (Cibiogás), até 2023 eram 404 plantas de biogás instaladas no Paraná, com ampla folga na liderança a nível nacional. De 2022 para 2023, o número de plantas cresceu 54% — antes eram 262. O Estado responde por 29,59% das plantas de biogás no Brasil. Minas Gerais aparece em segundo lugar, com 348 unidades, e Santa Catarina, com 122.
Em termos de produção de biogás, a região Sul produziu 862 milhões de metros cúbicos normal (Nm³), sendo que o Paraná é responsável
por 53,4% desse volume, com 461 milhões de Nm³, crescimento de 20% em relação a 2022.
Em um biodigestor, os dejetos animais são decompostos por bactérias em um ambiente sem oxigênio. Durante esse processo, é produzido o biogás, uma mistura de metano e dióxido de carbono, que pode ser utilizado para gerar energia elétrica através de motores a gás. “Todos os projetos que temos têm um retorno sobre o capital investido de cerca de quatro a cinco anos. Para linhas de crédito de seis anos isso significa que, antes de vencer o financiamento, uma vez que ele é 100% financiado para o produtor, ele já recuperou o capital investido”, salienta o coordenador.
O financiamento dos Fincke foi de aproximadamente R$ 700 mil, com prazo de pagamento de dez anos e carência de três. Quando a granja opera com capacidade total de suínos, o biodigestor chega a gerar entre 25 e 30 mil quilowatts/mês, sem contar a energia que é utilizada na propriedade, para bombear o digestato na plantação de soja e milho, rico em nutrientes.
“O dejeto é um problema para todos os produtores de suínos. Não épossível jogar ele diretamente na lavoura, pois dessa forma ele danifica as plantas. E com os tanques todos cheios, não se consegue limpar o chiqueiro. Agora isso mudou”, celebra o suinocultor. “O tratamento do dejeto é outro. Os gases já foram embora, então você não prejudica o meio ambiente e até mesmo a própria lavoura. Você não está jogando um esterco cru, mas sim uma adubação de qualidade”, complementa Adilson. Com isso, os gastos com a compra de adubo também caíram.
Mais renda
Os Fincke decidiram vender a energia produzida pelo biodigestor, em vez de usar na propriedade. “O que sobra eu vendo para uma cooperativa específica de energia”, comenta. Com a comercialização, na casa dos R$ 15 mil mensais, eles conseguem quitar a parcela do financiamento e ainda sobra para pagar a conta de luz da granja, por volta de R$ 3 mil/mês.
Com o retorno, já existem projetos para ampliar a capacidade da granja. Um segundo tanque para digestato está em construção, enquanto que o primeiro permanecerá com o líquido em “descanso”, aumentando seu potencial fertilizador. Os planos também envolvem a quantidade de suínos. “Estamos estudando. Talvez fazer mais mais duas granjas, chegando a dez mil animais. As empresas querem concentrar tudo num só lugar, é mais fácil, mais cômodo para eles”, comentou.
Suínos no Paraná
O Paraná é o segundo maior produtor de suínos do Brasil, com pouco mais de 12 milhões de unidades em 2023 – 21,2% da produção nacional. O Estado fica atrás somente de Santa Catarina (29,5%) e à frente do Rio Grande do Sul (17%). O Valor Bruto da Produção (VBP) da suinocultura foi de R$ 12,5 bilhões em 2023.
De acordo com dados do Departamento de Economia Rural (Deral), da Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento (Seab), o
Paraná é o terceiro maior exportador do Brasil, com 168 mil toneladas enviadas ao mercado internacional em 2023 e comércio com 75 países. Santa Catarina e Rio Grande do Sul completam o pódio, em primeiro e segundo lugares, respectivamente.
Série
A série de reportagens “Paraná, a Energia Verde que Renova o Campo” está mostrando exemplos de produtores rurais de todo o Estado que aderiram ao programa RenovaPR para implantar sistemas de energias renováveis em suas propriedades. Criado em 2021, o RenovaPR apoia a instalação de unidades de geração distribuída em propriedades rurais paranaenses e, junto ao Banco do Agricultor Paranaense, permite que o produtor invista nesses sistemas com juros reduzidos. Todas as reportagens da série podem ser conferidas neste link.
Suínos
Paraná desenvolve sistema para fortalecer biosseguridade nas granjas suínas
Médico-veterinário aponta pontos críticos que ameaçam a biosseguridade nas granjas suínas, destacando os principais fatores de risco e as medidas preventivas essenciais para mitigar a introdução e disseminação de patógenos.
A biosseguridade nas granjas de suínos tem sido amplamente discutida por todos os elos da cadeia, principalmente diante dos desafios atuais enfrentados pelo setor suinícola. Durante o Congresso de Suinocultores e Avicultores O Presente Rural, realizado em meados de junho em Marechal Cândido Rondon, no Oeste do Paraná, o médico-veterinário, mestre em Ciências Animais, auditor fiscal agropecuário e gerente de Saúde Animal da Agência de Defesa Agropecuária do Paraná (Adapar), Rafael Gonçalves Dias, trouxe à tona pontos críticos que ameaçam a biosseguridade nas granjas suínas, destacando os principais fatores de risco e as medidas preventivas essenciais para mitigar a introdução e disseminação de patógenos.
O profissional enfatiza que a biosseguridade em unidade de produção é essencial para evitar a entrada e a propagação de doenças no rebanho, garantindo a saúde dos animais e a sustentabilidade da produção suinícola. No Paraná, a Portaria 265, publicada em setembro de 2018, estabelece os itens estruturais que cada granja deve ter, conforme o modo produtivo, para proteger as unidades da disseminação de doenças e agentes infecciosos. Essa normativa define 14 critérios de avaliação para a prevenção externa e 10 para a prevenção interna, que são fundamentais para a manutenção da biosseguridade.
Dias adianta que a Adapar planeja ainda este ano sistematizar essas informações contidas na Portaria 265, mensurando e quantificando a situação atual das granjas paranaenses. “Para isso, será desenvolvido um sistema de informação que vai permitir a coleta de dados de caracterização das granjas de forma organizada e segura, processando-os por meio de um modelo multicritério para obter indicadores de biosseguridade”, antecipa.
Conforme o médico-veterinário, esse sistema será acessível via aplicativo web, proporcionando uma avaliação detalhada de biosseguridade de propriedade a propriedade. “Serão levantados dados críticos, como a origem dos animais e a presença de cercas de isolamento. Os resultados serão quantificados em níveis que variam de 1 a 5 para origem dos animais e de 1 a 9 para cercas, em escalas de 0 a 100, permitindo uma análise precisa e detalhada”, explica Dias.
Os dados coletados serão apresentados por meio de dashboards e mapas, possibilitando avaliar tanto as condições de granjas individuais quanto obter um panorama geral por integração e da região geográfica. “Essa visualização clara e integrada dos dados vai permitir identificar possíveis problemas e criar estratégias eficientes para implantar um plano de biosseguridade. Como resultado, teremos um dashboard detalhado de cada granja, facilitando a identificação de pontos críticos e a implementação de medidas corretivas. Com essas informações, será possível desenvolver e executar planos de biosseguridade personalizados, garantindo a proteção do rebanho e a sustentabilidade da produção suinícola no Paraná”, salienta.
A partir da implementação deste sistema de avaliação da biosseguridade nas granjas paranaenses de suínos, o auditor fiscal agropecuário menciona que a cadeia produtiva deve sofrer um impacto significativo, visto que aquelas propriedades que não terão condição de adequação para produção de suínos devem acabar saindo da atividade. “Não podemos colocar toda a cadeia de suínos em risco em função de uma ou outra propriedade que não tem condição estrutural de criar suínos”, ressalta Dias.
Isolamento da granja contra invasores
O gerente de Saúde Animal da Adapar afirma que entre os itens de biosseguridade mais importantes de uma unidade de produção suinícola devem estar as cercas. “As cercas são essenciais porque, entre os diversos problemas que temos no Brasil, estão os javalis. Precisamos ter essa barreira física para proteger nossas propriedades dos animais de vida livre e até mesmo dos animais domésticos, que podem trazer doenças para dentro do plantel suíno. As cercas blindam a entrada e protegem a criação”, argumenta Dias.
Os javalis representam uma ameaça significativa à biosseguridade das granjas, uma vez que migram facilmente de região e circulam de Norte a Sul do Brasil. Uma das doenças que essa espécie pode transmitir é a Peste Suína Clássica (PSC), colocando em risco a saúde dos suínos e a sustentabilidade da produção. “O novo sistema da Adapar vai permitir a coleta e análise detalhada de dados, facilitando a identificação de problemas e a implementação de estratégias de biosseguridade mais eficazes. Com isso, esperamos melhorar de forma significativa a proteção das granjas paranaenses, garantindo um ambiente seguro e saudável para a criação de suínos”, aponta Dias.
Ameaças à biosseguridade
Um ponto crítico para a biosseguridade nas granjas suínas é a presença de agentes patogênicos. Além da febre aftosa e do Senecavírus A, outras doenças vesiculares que afetam suínos são estomatite vesicular, exantema vesicular e doença vesicular em suínos (SVDV), as quais são consideradas exóticas e não circulam no Brasil. Dias ressalta que a grande ‘dor de cabeça’ do setor reside no Senecavírus A, que tem crescido a incidência da doença nas granjas nos últimos 10 anos. “Por causar lesões vesiculares, os sintomas são facilmente confundidos com febre aftosa, gerando muito estresse no campo”, frisa.
A questão não é exclusiva do Brasil, com a doença diagnosticada em países como os Estados Unidos, onde circula desde 1988; e há relatos recentes no Canadá, China, Nova Zelândia, Austrália, Tailândia, Colômbia e Chile. No Brasil, o Paraná, Mato Grosso do Sul, Goiás, Santa Catarina e Rio Grande do Sul relatam casos, mas nenhum em nível comparável ao estado paranaense. “Em 2022, o Paraná atingiu o pico da doença com mais de 1.700 casos”, destaca o médico-veterinário, contando que cerca de 70% dos municípios paranaenses nunca tiveram casos suspeitos da doença, enquanto 30% tiveram casos investigados entre 2005 e 2021. “Os primeiros meses do ano tendem a registrar um aumento nos casos, enquanto os meses mais frios mostram uma tendência de diminuição, uma variabilidade observada nos últimos 10 anos”, menciona Dias.
Desafios e soluções na identificação do Senecavírus A
O médico-veterinário aponta 12 principais desafios na identificação do Senecavírus A na suinocultura paranaense. O primeiro listado são as condições das propriedades, com animais sujos, que dificultam a verificação das lesões, seguido da falta de vistoria prévia por parte dos médicos-veterinários. O terceiro desafio diz respeito as lesões causadas por outros motivos, como traumas, frequentemente confundidas com febre aftosa. O quarto são as notificações infundadas feitas por muitos produtores por receio do serviço de inspeção.
O ponto seguinte está relacionado ao estresse no transporte dos animais, que pode ocasionar lesões, complicando o diagnóstico. O sexto desafio é que enquanto é aguardado a investigação da Adapar, o abate precisa ser interrompido, gerando problemas na estocagem até a obtenção dos resultados laboratoriais, sendo esta a sétima dificuldade encontrada pelo setor.
O oitavo desafio diz respeito às propriedades interditadas que acabam por comprometer as escalas de abate, situação esta atrelada ao nono desafio, que o tempo a mais que ficam nas propriedades podem deixar os animais estressados, podendo provocar o aparecimento de lesões. O décimo desafio está ligado ao tempo de reação da cadeia que, devido ao alto número de notificações, impede que os órgãos de defesa agropecuária, como a Adapar, atendam a todos os casos no tempo desejado.
A logística das amostras até o LFDA-MG é complexa e a vigilância de outras doenças é prejudicada para atender às notificações de Senecavírus A fecham o ranking dos 12 principais desafios na identificação da doença.
Entre as possíveis soluções para minimizar esses obstáculos apontadas por Dias incluem a implementação de intervalos entre lotes, desinfecção e vacinação, além de investimentos em biosseguridade. “Isso envolve edificações teladas e cercadas, ambientes limpos, água e ração de qualidade, trocas de roupas nas áreas limpas e evitar visitas de pessoas e veículos nas granjas”, evidencia, ressaltando: “A cadeia suína deve se preparar cada vez mais para novos desafios sanitários”.
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