José Antônio Ribas Jr Opinião
Infraestrutura deficiente destrói a competitividade catarinense
Em Santa Catarina estamos próximos de um apagão logístico em face do péssimo estado do sistema viário
Artiogo escrito por: José Antônio Ribas Júnior, presidente do Sindicato das Indústrias da Carne e Derivados no Estado de Santa Catarina (Sindicarne).
Em uma economia de escala, os ganhos de produtividade se contam em miligramas, em segundos, em centímetros – enfim, em medidas infinitesimais que refletem o aumento contínuo da eficiência produtiva em várias fases do processo. Na suinocultura e na avicultura industrial, duas imensas e avançadíssimas cadeias produtivas, todas as etapas da produção agregam método e tecnologia, do campo ao frigorífico, dos centros de distribuição aos mercados de consumo, dentro e fora do País. Mas uma deficiência excluída do alcance das empresas destrói todos os ganhos – a infraestrutura.
O mundo aprendeu a admirar essas duas cadeias produtivas como paradigmas de desenvolvimento tecnológico, mas o que o mundo desconhece é que as péssimas condições das estradas devoram a eficiência. Levar todas as matérias-primas para milhares de estabelecimentos rurais e, depois, apanhar os produtos (aves, suínos, leite, grãos, frutas etc.) prontos para processamento nas agroindústrias é uma operação penosa e cara porque as estradas vicinais vivem, de regra, em mau estado de conservação.
Depois de processados, transportar os produtos acabados para os portos ou para os centros de consumo é outra operação igualmente custosa. Dez em cada dez agentes econômicos concordam que a recuperação das rodovias vicinais, intermunicipais, estaduais e federais é fator essencial e urgente para proteger a competitividade das empresas catarinenses e, em especial, para o agronegócio.
Em Santa Catarina estamos próximos de um apagão logístico em face do péssimo estado do sistema viário. As más condições das rodovias encarecem em até 40% o transporte, retirando dos produtores rurais e das indústrias a competitividade para disputar os mercados nacional e internacional. Recentes estudos do Instituto de Pesquisas Rodoviárias (IPR) revelam que o péssimo estado de conservação da rede viária resulta em até 58% de acréscimo do consumo de combustível, 40% de aumento no custo operacional dos veículos (como pneus e mecânica), 50% na elevação do índice de acidentes e 100% de acréscimo no tempo de viagem. Publicações técnicas internacionais apontam que para cada US$ 1 não aplicado em manutenção corretiva e conservação da rodovia, é necessária a aplicação de US$ 3 a US$ 4 na restauração.
Estudo da Federação das Indústrias apontou que nas áreas de produção agropecuária (oeste, extremo oeste e região do Contestado) a situação dos 1.265 km de rodovias estaduais ali existentes é de precariedade. No oeste e extremo oeste foram avaliadas as SCs 155, 480, 305, 160, 161, 163, 386, 283 e 154. No Contestado foram analisadas as SCs 350, 135, 150, 355, 465, 464, 452 e 120. As rodovias federais BR-282, BR-163 e BR-158 também estão esgotadas e em más condições de conservação. Acrescente-se a BR-470 – que interliga a BR-282 (e o grande oeste) com a BR-101 e os portos catarinenses – que reclama duplicação, pois está exaurida em sua capacidade de escoamento.
Os governos federal e catarinense precisam investir valores muito superiores ao despendido nos últimos dois anos e meio. O estudo da Fiesc destaca ainda que é necessário investir cerca de R$ 210 milhões por ano para manter a malha estadual. Esse valor representa 1% do patrimônio rodoviário catarinense, avaliado em R$ 21 bilhões. Santa Catarina tem cerca de 6 mil km de rodovias estaduais. Em meados de junho, o governo catarinense informou que investiu R$ 93 milhões na recuperação e restauração de rodovias estaduais, desde o início da atual gestão. O valor é de aproximadamente R$ 37,2 milhões por ano, muito aquém do ideal recomendado.
As condições em que se encontram as rodovias catarinenses compõe uma face do chamado “custo Brasil”, refletindo uma situação que impregna e vergasta todas as atividades porque impõe baixa produtividade, lentidão, excessiva burocracia, supercentralização, gigantismo e gargalos.
Defender o sistema agroindustrial catarinense é defender empregos, riquezas e tributos. As indústrias da proteína animal representam 31% do PIB estadual, respondem por 70% das exportações, sustentam diretamente o emprego de 60 mil catarinenses e, indiretamente, 480 mil trabalhadores. No campo, são mais de 66 mil propriedades rurais integradas, gerando matéria-prima para o abate de 34 mil suínos/dia e de mais de 3 milhões de aves/dia. As vendas externas catarinenses responderam pela exportação de 57% do total de carne suína que o Brasil enviou ao exterior e por 28% das exportações brasileiras de aves.
Obter esses resultados com as condições de infraestrutura que Santa Catarina ostenta é um milagre.
Colunistas Opinião
Ferrovias ou morte!
Ferrovias, como se sabe, são obras caras e cuja execução é de longa duração. A única certeza que se tem, hodiernamente, é que as agroindústrias catarinenses se transferirão para outras regiões se as ferrovias não viabilizarem no horizonte próximo o oxigênio que necessitam, ou seja, o suprimento de grãos.
É inquestionável a importância do agronegócio para Santa Catarina: ele representa 30% do PIB estadual e contribuiu com 70% das exportações. Santa Catarina é o maior produtor brasileiro de suínos e detém a vice-liderança na produção de aves. A matéria-prima para abastecer a vasta cadeia agroindustrial é fornecida por 20 mil avicultores e suinocultores e 70 mil criadores de bovinos de leite.
O volume anual de animais criados, processados e industrializados chega a 852 milhões de aves e 15 milhões de suínos por ano. A nutrição desse formidável plantel exige cerca de 6,5 milhões de toneladas de milho por ano, na formulação de rações, mas Santa Catarina vem produzindo cada vez menos esse cereal. Na última safra ficou em torno de 2 milhões de toneladas. E ainda há um detalhe: 40% do milho vão para silagem, portanto não sai da propriedade e 60% vai para o mercado de grãos.
Os cerca de 5 milhões de toneladas que faltam são obtidas no centro-oeste brasileiro e, suplementarmente, no Paraguai e na Argentina – com imensas despesas com o transporte rodoviário. As agroindústrias desembolsam entre 6 bilhões e 7 bilhões de reais por ano em fretes para buscar o milho no centro-oeste (basicamente Mato Grosso do Sul e Mato Grosso) em uma operação rodoviária economicamente cada vez mais inviável e ambientalmente cada vez mais desaconselhável.
Falta muito pouco para os empresários concluírem que é mais barato transferir as indústrias frigoríficas para a região produtora de milho e soja do que ficar despejando essa dinheirama no crescentemente caro e inviável transporte rodoviário.
A saída para esse drama é a construção de uma ferrovia ligando o oeste catarinense ao centro-oeste brasileiro. Pela primeira vez em 40 anos está surgindo a consciência, no empresariado, de que o desenvolvimento e o futuro do grande oeste catarinense dependem de uma ferrovia ligando essas duas regiões.
O governo federal muito acertadamente instituiu o novo marco legal das ferrovias através da MP 1065/2021 e deve, em maio deste ano, leiloar vários trechos. A alternativa que surge vem do Paraná, onde a Ferroeste – uma estatal de economia mista – pretende construir ou estimular que consórcios empresariais construam os ramais Cascavel-Chapecó, Cascavel-Maracaju (MS) e Cascavel-Paranaguá (PR). Essas rotas são exatamente aquelas que o oeste precisa para buscar matéria-prima vegetal, transformá-la em proteína animal e depois levá-la aos portos.
Para estimular investidores a se interessar pelo ramal Chapecó-Cascável um grupo de entidades catarinenses – Sindicarne/Acav, Acic, CEC, Faesc, Fiesc, Facisc e Ocesc, além da ABPA – está desembolsando 750 mil reais para pagar um EVETEA (estudo de viabilidade econômica, técnica e ambiental) para demonstrar a viabilidade do empreendimento. A execução desses projetos tornará suportável e megaoperação de transferência de grãos para Santa Catarina e dos produtos acabados para os portos do Paraná. Terá cerca de 280 quilômetros de extensão, o trajeto será indicado pelo estudo técnico e o custo gira em torno de 6 bilhões de reais.
E os portos catarinenses, como ficam? Outra obra, que já foi chamada de “Ferrovia do Frango”, atraiu finalmente a atenção do governo barriga-verde, que promete licitar a contratação do projeto. Essa ferrovia intraterritorial pretende ligar o extremo-oeste com os portos marítimos, com mais de 600 quilômetros de extensão. As duas ferrovias são complementares, uma não exclui a outra e ambas são necessárias.
Ferrovias, como se sabe, são obras caras e cuja execução é de longa duração – por isso são revestidas de incertezas e demorada maturação. A única certeza que se tem, hodiernamente, é que as agroindústrias catarinenses se transferirão para outras regiões se as ferrovias não viabilizarem no horizonte próximo o oxigênio que necessitam, ou seja, o suprimento de grãos.
José Antônio Ribas Jr Opinião
Brasil: falta inteligência agrícola
Estabelecer regras para evitar que a exportação excessiva crie perigosa escassez no mercado interno será, com certeza, uma reivindicação de setores produtivos ao governo federal
Artigo escrito por José Antônio Ribas Jr, presidente da Associação Catarinense de Avicultura (ACAV)
Estabelecer regras para evitar que a exportação excessiva – geralmente puxada por situação cambial favorável – crie perigosa escassez no mercado interno será, com certeza, uma reivindicação de setores produtivos ao governo federal. A medida está inspirada na segurança alimentar do Brasil e pretende situar esse tema de maneira estratégica na agenda da alta administração federal.
A situação se repete de tempos em tempos no mercado de milho e soja: os ótimos preços internacionais e a taxa cambial estimulam vendas maciças para o mercado internacional e a matéria-prima acaba faltando no mercado doméstico.
A gravidade dessa questão é perturbadora. Nesse momento não há oferta desses grãos no Brasil, mesmo com os preços em patamares estratosféricos, com aumentos que variam de 100% a 300% no período janeiro-outubro. Essa situação afeta diretamente setores sensíveis como as indústrias de óleos vegetais, os laticínios e as agroindústrias de processamento de carne.
A saca de milho (60 kg) que era comercializada em janeiro a R$ 35,00 agora está em R$ 80,00. A saca da soja que estava cotada a R$ 75,00 no início do ano, agora está acima de R$ 160,00. A tonelada do farelo de soja que custava R$ 900,00 em janeiro subiu para R$ 2.700,00 em outubro. A saca do arroz (50 kg) era vendida a R$ 50,00 no início deste ano, mas agora passa de R$ 100,00.
Milho e farelo de soja são insumos essenciais para a nutrição animal e seu encarecimento torna mais cara a produção de carnes de aves e suínos. Com isso, os preços das carnes e de todos os seus derivados – presuntos, apresuntados, linguiças, copa, salame, salgados, marinados, empanados etc. – inevitavelmente chegarão às festas de fim de ano mais elevados.
O Brasil, como país capitalista e adepto da liberdade econômica, não tolera propostas de confisco de produção ou contingenciamento de exportação, porém algumas situações precisam ser revistas. Não é racional exportar toda a produção e deixar o mercado interno fragilizado, ameaçado de ver o gigantesco parque agroindustrial da carne paralisado por falta de grão, com milhões de cabeças alojadas e sem alimentação em milhares de estabelecimentos rurais.
Cenários como esse são potencialmente inflamáveis e podem dizimar milhões de empregos e incinerar bilhões de reais em prejuízos.
No passado, essas crises eram amenizadas pelo regime de estoques reguladores da Companhia Nacional de Abastecimento, mas o dinamismo e o agigantamento do mercado tornaram essa operação muito complexa e demandante de muitos recursos.
Hodiernamente tornou-se imperioso e de interesse nacional estabelecer uma política de proteção interna, como já o fizeram países desenvolvidos em situações semelhantes, mediante a fixação de cotas de exportação, acima das quais aplica-se taxação corretiva para evitar desabastecimento interno. Não se trata de intervenção, mas de moderação.
Essa missão cabe a uma agência de inteligência agrícola, de composição híbrida governo/indústria, capaz de implementar estratégias comerciais para o sucesso do agronegócio, beneficiando produtores, indústrias, governo e consumidores. Inteligência sempre será o melhor caminho.