Notícias
Hidrogênio sustentável e ‘pré-sal caipira’ podem despontar na transição energética do Brasil
Especialistas destacam papel dos biocombustíveis e da economia circular do setor sucroenergético para alcançar objetivos de desenvolvimento no país.

A produção em escala de hidrogênio de baixa emissão de carbono, a expansão do biogás e a consolidação de uma economia circular no setor sucroalcooleiro nacional compõem um possível cenário favorável ao cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) no Brasil, apontaram especialistas na última quinta-feira (09) durante a Conferência Energy Transition Research & Innovation (ETRI 2023), promovida pelo Centro de Pesquisa e Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI), em São Paulo.
Em 2015, a Organização das Nações Unidas (ONU) definiu 17 grandes objetivos, em um apelo global por ações que acabem com a pobreza, protejam o ambiente e garantam paz e prosperidade a todos, compondo uma agenda mundial para orientar as políticas públicas dos países até 2030. “Na minha concepção, os ODS têm o mesmo princípio utópico da definição de saúde. São praticamente impossíveis de serem alcançados. Mas aí estão indicadas as questões centrais que podem ser feitas e que orientam o processo de tomada de decisão – seja no governo, no parlamento, no poder judiciário, nos setores empresariais e na sociedade civil como um todo”, comentou o engenheiro civil Arlindo Philippi Junior, chefe de gabinete da reitoria da Universidade de São Paulo (USP) e docente na Faculdade de Saúde Pública, ao abrir o painel “A evolução dos ODS no Brasil”, do qual foi moderador, na Cidade Universitária, na capital paulista.
Tanto a engenharia química Suani Teixeira Coelho, professora do Programa de Pós-Graduação em Energia da USP e vice-diretora do Programa Advocacy do RCGI; a advogada Patrícia Iglecias, superintendente de Gestão Ambiental da USP e ex-secretária do Meio Ambiente do Estado de São Paulo; como a engenheira química Tamar Roitman, gerente executiva da Associação Brasileira de Biogás (Abiogás), mencionaram a experiência brasileira com biocombustíveis, em especial o etanol do setor sucroalcooleiro. “O etanol tem em média uma intensidade de carbono de 28 gramas de CO2 por megajoule. É uma média, pois temos usinas com 15, usinas com 30. A gasolina tem 87 gramas de CO2 por megajoule. É claro que a substituição da gasolina pelo etanol traz benefícios bastante importantes para o meio ambiente”, afirmou Teixeira Coelho.
De acordo com ela, o balanço do etanol não é zero “porque ainda temos o uso de diesel na agricultura e o uso de fertilizantes de origem fóssil”. “Na medida em que substituirmos esses fertilizantes por outros de origem renovável, como os feitos a partir de hidrogênio baseado na biomassa, e na medida em que substituirmos o diesel por biometano, por exemplo, teremos uma intensidade de carbono ainda menor”, afirmou a pesquisadora. O hidrogênio produzido a partir do etanol, como o de um projeto piloto construído na Cidade Universitária que será inaugurado em 2024, é outro vetor importante para a transição, disse a especialista. “Podemos produzir hidrogênio a partir da reforma do etanol, a partir da eletrólise da água usando excedente de bagaço, a partir do biogás do processo de reforma. E esse hidrogênio acoplado aos diferentes processos de captura e estocagem de CO2 traz perspectivas bastante interessantes para o setor”, afirmou Suani Coelho.
Potência brasileira
A produção de bioenergia como um todo faz muito sentido e se trata de uma potência do Brasil, ressaltou Roitman. “Em nenhum momento ela compete com a produção de alimentos e só aumenta as práticas de sustentabilidade, gerando mais receita, mais empregos, mais sustentabilidade no campo”, afirmou, ressaltando que o biogás no Brasil é produzido a partir de resíduos, principalmente do setor sucroenergético, e muitas vezes é chamado de “pré-sal caipira”, por estar no interior do país.
De acordo com ela, apenas com a geração de resíduos do setor sucroenergético, no setor de proteína animal, na cadeia agroindustrial e com os resíduos sólidos urbanos e de estação de tratamento de esgoto, o país poderia produzir 120 milhões de metros cúbicos por dia de biometano – bem próximo dos cerca de 130 milhões de metros cúbicos produzidos por dia de gás natural. “É o nosso pré-sal verde; com esse volume, poderíamos suprir todo esse consumo de gás natural e diminuiríamos a dependência de combustível fóssil importado”, disse, enfatizando: “Os resíduos que hoje são passivos ambientais podem se tornar ativos energéticos, gerando energia, crédito de carbono, sustentabilidade e receitas para quem tem essas biomassas”.
A gerente da Abiogás informou que há hoje no país 855 plantas de biogás e a projeção feita pela associação é de que a produção passe dos atuais cerca de 500 mil metros cúbicos para 6,6 milhões de metros cúbicos em 2029, apenas com base nos projetos atuais. Entre os desafios para a expansão, está a questão da infraestrutura e da regulamentação do mercado de carbono. “Nosso mundo foi desenhado para a cadeia de petróleo e gás natural, então são necessários vários ajustes, para considerar uma fonte que tem características diferentes: é descentralizada, tem uma menor escala de produção e está pulverizada”, comentou Roitman.
Em sua exposição, advogada Patrícia Iglecias disse ter percebido uma evolução rumo à transição energética e destacou a ação do governo paulista com relação ao setor sucroenergético como um bom exemplo de como levar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável — algo da esfera teórica — para a realidade local, conectando os setores público, privado e a academia. “Passamos a implementar no Estado de São Paulo práticas voltadas para a sustentabilidade, como a eliminação da queima da palha da cana antes dos prazos previstas por lei. Foi uma construção conjunta; vamos nos afastando da ideia de comando e controle, de simplesmente obrigar pela lei, e construímos em conjunto com os setores envolvidos. A meu ver, o segredo para o avanço dos objetivos de desenvolvimento sustentável é também dirigir o olhar para como faremos isso em conjunto. O ODS 17, que trata das parcerias, é o principal.”
Ao final do painel, Sérgio Murilo, chefe de gabinete do deputado federal Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), expôs três iniciativas em tramitação no Congresso Nacional relacionadas à transição energética. Uma delas é a comissão especial do hidrogênio sustentável, que realizou ao menos seis audiências públicas, cujo relatório final deve ser apresentado no fim de novembro. “São propostas que regulam e definem o papel do hidrogênio na nossa matriz energética”, afirmou Murilo.
O segundo projeto aborda a questão do mercado de etanol, do querosene sustentável de aviação e do diesel verde. Entre outros pontos, prevê que a mistura do etanol na gasolina – cujo teto hoje chega a 27,5% — aumente para 30%, informou o assessor parlamentar. E o terceiro projeto cria o Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten). “Esse projeto surgiu a partir de advogados do setor de infraestrutura, dá segurança jurídica, cria toda uma sistemática de regulamentação, propõe linhas de financiamento e a criação de um fundo verde, com precatórios e fundos patrimoniais”, disse. “A estimativa é de que ele possa alavancar R$ 3,5 trilhões.”
Sobre o RCGI
O Centro de Pesquisa e Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI) é um Centro de Pesquisa em Engenharia, criado em 2015, com financiamento da Fapesp e da Shell Brasil e outras empresas por meio dos recursos previstos na cláusula de P,D&I da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) dos contratos de exploração e comercialização de petróleo e gás.
Atualmente estão em atividade cerca de 60 projetos de pesquisa, ancorados em sete programas: NBS (Nature Based Solutions); CCU (Carbon Capture and Utilization); BECCS (Bioenergy with Carbon Capture and Storage); GHG (Greenhouse Gases), Advocacy, Innovation Power Systems e Decarbonization.
O centro, que conta com cerca de 600 pesquisadores, mantém colaborações com diversas instituições, como Oxford, Imperial College, Princenton e o National Renewable Energy Laboratory (NREL), além de projetos de longo prazo com centros de pesquisa dos Estados Unidos por meio da iniciativa Center 2 Center (C2C), financiada pela FAPESP e pela National Science Foundation.

Notícias
Santa Catarina registra avanço simultâneo nas importações e exportações de milho em 2025
Volume importado sobe 31,5% e embarques aumentam 243%, refletindo demanda das cadeias produtivas e oportunidades geradas pela proximidade dos portos.

As importações de milho seguem em ritmo acelerado em Santa Catarina ao longo de 2025. De janeiro a outubro, o estado comprou mais de 349,1 mil toneladas, volume 31,5% superior ao do mesmo período do ano passado, segundo dados do Boletim Agropecuário de Santa Catarina, elaborado pela Epagri/Cepa com base no Comex Stat/MDIC. Em termos de valor, o milho importado movimentou US$ 59,74 milhões, alta de 23,5% frente ao acumulado de 2024. Toda a origem é atribuída ao Paraguai, principal fornecedor externo do cereal para o mercado catarinense.

Foto: Claudio Neves
A tendência de expansão no abastecimento externo se intensificou no segundo semestre. Em outubro, Santa Catarina importou mais de 63 mil toneladas, mantendo a curva ascendente registrada desde julho, quando os volumes mensais passaram consistentemente da casa das 50 mil toneladas. A Epagri/Cepa aponta que esse movimento deve avançar até novembro, período em que a demanda das agroindústrias de aves, suínos e bovinos segue aquecida.
Os dados mensais ilustram essa escalada. De outubro de 2024 a outubro de 2025, as importações variaram de mínimas próximas a 3,4 mil toneladas (março/25) a máximas superiores a 63 mil toneladas (setembro/25). Nesse intervalo, meses como junho, julho e agosto concentraram forte entrada do cereal, acompanhados de receitas que oscilaram entre US$ 7,4 milhões e US$ 11,2 milhões.
Exportações crescem apesar do déficit interno
Em um cenário aparentemente contraditório, o estado, que possui déficit anual estimado em 6 milhões de toneladas de milho para suprir seu grande parque agroindustrial, também ampliou as exportações do grão em 2025.
Até outubro, Santa Catarina embarcou 130,1 mil toneladas, um salto de 243,9% em relação ao mesmo período de 2024. O valor exportado também chamou atenção: US$ 30,71 milhões, alta de 282,33% na comparação anual.

Foto: Claudio Neves
Segundo a Epagri/Cepa, essa movimentação ocorre majoritariamente em regiões produtoras próximas aos portos catarinenses, onde os preços de exportação tornam-se mais competitivos que os do mercado interno, especialmente quando o câmbio favorece vendas externas ou quando há descompasso logístico entre oferta e demanda regional.
Essa dinâmica reforça um traço estrutural conhecido do agro catarinense: ao mesmo tempo em que é um dos maiores consumidores de milho do país, devido ao peso das cadeias de proteína animal, Santa Catarina não alcança autossuficiência e depende do cereal de outras regiões e países para abastecimento. A exportação pontual ocorre quando há excedentes regionais temporários, oportunidades comerciais ou vantagens logísticas.
Perspectivas
Com a entrada gradual da nova safra 2025/26 no estado e no Centro-Oeste brasileiro, a tendência é que os volumes importados se acomodem a partir do fim do ano. No entanto, o comportamento do câmbio, os preços internacionais e o resultado final da produção catarinense seguirão determinando a necessidade de compras externas — e, por outro lado, a competitividade das exportações.
Para a Epagri/Cepa, o quadro de 2025 reforça tanto a importância do milho como insumo estratégico para as cadeias de proteína animal quanto a vulnerabilidade decorrente da dependência externa e interestadual do cereal. Santa Catarina continua sendo um estado que importa para abastecer seu agro e exporta quando a lógica de mercado permite, um equilíbrio dinâmico que movimenta portos, indústrias e produtores ao longo de todo o ano.
Notícias
Brasil e Japão avançam em tratativas para ampliar comércio agro
Reunião entre Mapa e MAFF reforça pedido de auditoria japonesa para habilitar exportações de carne bovina e aprofunda cooperação técnica entre os países.

OMinistério da Agricultura e Pecuária (Mapa), representado pelo secretário de Comércio e Relações Internacionais, Luis Rua, realizou uma reunião bilateral com o vice-ministro internacional do Ministério da Agricultura, Pecuária e Florestas (MAFF), Osamu Kubota, para fortalecer a agenda comercial entre os países e aprofundar o diálogo sobre temas da relação bilateral.
No encontro, a delegação brasileira apresentou as principais prioridades do Brasil, incluindo temas regulatórios e iniciativas de cooperação, e reiterou o pedido para o agendamento da auditoria japonesa necessária para a abertura do mercado para exportação de carne bovina brasileira. O Mapa também destacou avanços recentes no diálogo e reforçou os pontos considerados estratégicos para ampliar o fluxo comercial e aprimorar mecanismos de parceria.
Os representantes japoneses compartilharam seus interesses e expectativas, demonstrando disposição para intensificar o diálogo técnico e buscar convergência nas agendas de interesse mútuo.
Notícias
Bioinsumos colocam agro brasileiro na liderança da transição sustentável
Soluções biológicas reposicionam o agronegócio como força estratégica na agenda climática global.

A sustentabilidade como a conhecemos já não é suficiente. A nova fronteira da produção agrícola tem nome e propósito: agricultura sustentável, um modelo que revitaliza o solo, amplia a biodiversidade e aumenta a captura de carbono. Em destaque nas discussões da COP30, o tema reposiciona o agronegócio como parte da solução, consolidando-se como uma das estratégias mais promissoras para recuperação de agro-ecossistemas, captura de carbono e mitigação das mudanças climáticas.

Thiago Castro, Gerente de P&D da Koppert Brasil participa de painel na AgriZone, durante a COP30: “A agricultura sustentável é, em sua essência, sobre restaurar a vida”
Atualmente, a agricultura e o uso da terra correspondem a 23% das emissões globais de gases do efeito, aproximadamente. Ao migrar para práticas sustentáveis, lavouras deixam de ser fontes de emissão e tornam-se sumidouros de carbono, “reservatórios” naturais que filtram o dióxido de carbono da atmosfera. “A agricultura sustentável é, em sua essência, sobre restaurar a vida. E não tem como falar em vida no solo sem falar em controle biológico”, afirma o PhD em Entomologia com ênfase em Controle Biológico, Thiago Castro.
Segudo ele, ao introduzir um inimigo natural para combater uma praga, devolvemos ao ecossistema uma peça que faltava. “Isso fortalece a teia biológica, melhora a estrutura do solo, aumenta a disponibilidade de nutrientes e reduz a necessidade de intervenções agressivas. É a própria natureza trabalhando a nosso favor”, ressalta.
As soluções biológicas para a agricultura incluem produtos à base de micro e macroorganismos e extratos vegetais, sendo biodefensivos (para controle de pragas e doenças), bioativadores (que auxiliam na nutrição e saúde das plantas) e bioestimulantes (que melhoram a disponibilidade de nutrientes no solo).
Maior mercado mundial de bioinsumos
O Brasil é protagonista nesse campo: cerca de 61% dos produtores fazem uso regular de insumos biológicos agrícolas, uma taxa quatro vezes maior que a média global. Para a safra de 2025/26, o setor projeta um crescimento de 13% na adoção dessas tecnologias.
A vespa Trichogramma galloi e o fungo Beauveria bassiana (Cepa Esalq PL 63) são exemplos de macro e microrganismos amplamente utilizados nas culturas de cana-de-açúcar, soja, milho e algodão, para o controle de lagartas e mosca-branca, respectivamente. Esses agentes atuam nas pragas sem afetar polinizadores e organismos benéficos para o ecossistema.
Os impactos do manejo biológico são mensuráveis: maior porosidade do solo, retenção de água e nutrientes, menor erosão; menor dependência de fertilizantes e inseticidas sintéticos, diminuição na resistência de pragas; equilíbrio ecológico e estabilidade produtiva.
Entre as práticas sustentáveis que já fazem parte da rotina do agro brasileiro estão o uso de inoculantes e fungos benéficos, a rotação de culturas, a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) e o manejo biológico de pragas e doenças. Práticas que estimulam a vida no solo e o equilíbrio natural no campo. “Os produtores que adotam manejo biológico investem em seu maior ativo que é a terra”, salienta Castro, acrescentando: “O manejo biológico não é uma tendência, é uma necessidade do planeta, e a agricultura pode e deve ser o caminho para a regeneração ambiental, para esse equilíbrio que buscamos e precisamos”.



