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Como a crise entre Rússia e Ucrânia impacta o agronegócio
Eventos como o que agora ocorre no Leste Europeu são ainda mais alarmantes do que se imagina. Além das populações locais, colocadas na linha de fogo em um conflito com potencial humanitário dramático, a crise entre Ucrânia e Rússia pode reverberar na interrupção da produção agrícola e do comércio entre países, levando à escassez de alimentos em regiões distantes ou ao encarecimento dos itens para aqueles que ainda têm acesso.

Poucos setores da economia brasileira são mais globalizados que o agronegócio. Muito antes de a internet encurtar distâncias entre muitos de nós e o resto do mundo, nos escritórios de empresas e cooperativas espalhadas pelo interior do país já havia terminais conectados em tempo real com as principais bolsas de mercadoria do mundo, como a de Chicago.
Uma imensa teia global de suprimentos é necessária para buscar levar alimentos aos mais distantes cantos e, quando ela se rompe, os riscos aumentam para populações em todo o mundo. O ex-ministro da Agricultura Alysson Paolinelli costuma dizer que o agronegócio é um instrumento de paz. Quando a segurança alimentar é ameaçada, milhões de pessoas são colocadas em condição de vulnerabilidade.
Por isso, eventos como o que agora ocorre no Leste Europeu são ainda mais alarmantes do que se imagina. Além das populações locais, colocadas na linha de fogo em um conflito com potencial humanitário dramático, a crise entre Ucrânia e Rússia pode reverberar na interrupção da produção agrícola e do comércio entre países, levando à escassez de alimentos em regiões distantes ou ao encarecimento dos itens para aqueles que ainda têm acesso. Se à primeira vista a movimentação de tropas nas paisagens geladas daqueles países pode parecer distante, na prática o assunto diz respeito a todos, de forma mais direta do que um leigo pode imaginar.
Gigantes do agro
Quando a neve derrete no entroncamento entre a porção Sudoeste da Rússia, as terras ao Norte dos mares Negro e Cáspio e boa parte do território ucraniano, revela-se o chernozem, um solo preto, rico em húmus. Esse cinturão negro se transforma em um grande celeiro, que garante aos dois países papel de destaque nas exportações de produtos agrícolas.
- Juntas, Rússia e Ucrânia são responsáveis por mais de um quarto do comércio global de trigo.

Foto: Jaelson Lucas/AEN
- Exportações de óleo de soja têm crescido a taxas superiores a 18% ao ano.
- A Rússia só perde para Estados Unidos, Brasil e Argentina nas exportações de milho.
- Também são significativas as vendas externas de cevada e óleo de girassol e farelo de soja.
“Eles são fortes concorrentes potenciais do Brasil nos mercados mundiais de soja e milho, sob a batuta da China, que tenta reduzir a sua dependência em relação aos produtores das Américas”, escreveu, em artigo publicado no dia 18 passado, o professor Marcos Jank, coordenador do centro Insper Agro Global — co-assinam o texto os pesquisadores Niels Soendergaard e Cinthia Cabral da Costa, também do Insper Agro.
Assim, advertiu Jank, o conflito tem o previsível efeito de prejudicar a produção e a exportação da produção ucraniana, além de eventuais impactos à infraestrutura caso ferrovias, rodovias e portos sejam atingidos por bombardeios. No flanco russo, o risco vem com os embargos promovidos por eventuais compradores de seus grãos, resultando em menor oferta de commodities no mercado internacional.
“No curto prazo, portanto, de um lado vemos uma ameaça à segurança alimentar de diversos países que dependem de importações. De outro, produtores de grãos de concorrentes da Ucrânia e da Rússia, como é o caso do Brasil e Argentina, podem se beneficiar do aumento de preços e participação de mercado nas cadeias de milho, trigo e soja”, analisou.
Insumos em alta
Trata-se, no entanto, de um benefício ilusório, que pode ser anulado pelos impactos, também previsíveis, no

mercado de insumos. A Rússia é o principal vendedor de fertilizantes para o Brasil — no ano passado, 25% do total importado veio de lá. Em 2021, foram 3,6 milhões de toneladas de cloreto de potássio, com valor estimado em US$ 1,3 bilhão, e mais US$ 1,2 bilhão gastos na compra de ureia (1,3 milhão de toneladas), nitrato de amônio (1,4 milhão), nitrogênio, fósforo e potássio (967 mil), segundo noticiou o jornal Valor Econômico.
Uma eventual (ou até possível, em função de sanções econômicas impostas aos russos) interrupção no fluxo desses produtos deve comprometer ainda mais o fornecimento de fertilizantes no mercado brasileiro, que já tirava o sono de agricultores brasileiros. “Com as sanções ou até a perda de capacidade de exportação russa, os fertilizantes se tornam mais caros e a rentabilidade dos produtores brasileiros cai, afetando sua capacidade de continuar a ampliar a oferta nos próximos anos”, avalia o ex-ministro Maílson da Nóbrega, em entrevista à BBC.
O Brasil contava com o apoio russo para regularizar esse fornecimento. O assunto esteve na pauta da recente visita do presidente Jair Bolsonaro à Rússia. Lá, Bolsonaro teria obtido, do presidente Vladimir Putin, a garantia de que aquele país dobraria a oferta de fertilizantes aos Brasil. Com a deflagração do conflito, não há como ter certeza de que isso ocorrerá.
Diante desse cenário, a estratégia a ser adotada pelos produtores brasileiros deve ser um melhor planejamento e a busca de alternativas. O uso racional de fertilizantes, com utilização de ferramentas de agricultura de precisão, a substituição por biofertilizantes ou a adoção de práticas de agricultura regenerativa e rotação de culturas com foco na melhoria da qualidade do solo devem, cada vez mais, entrar no rol de opções dos agricultores.
Putin e o agro
Os russos são também clientes importantes do agronegócio brasileiro. Eles compraram, no ano passado, cerca de 770 mil toneladas de soja, 105 mil toneladas de frango, 35,3 mil toneladas de carne bovina, além de produtos como café, amendoim e açúcar. São volumes consideráveis, mas com tendência de baixa, a considerar os planos de Vladimir Putin para o agronegócio russo.
Na última década, ele inseriu o setor entre os mais estratégicos na lista dos investimentos estatais, ao lado de energia e eletrônica. Sua estratégia era justamente reduzir a dependência do país de compras externas, garantindo a autossuficiência na produção de alimentos ou, pelo menos, menor impacto em caso de eventuais embargos internacionais, como o que pode acontecer agora.
A ameaça não é uma novidade para ele. Em 2014, após a anexação da província da Crimeia, que também estava sob controle ucraniano, União Europeia, Estados Unidos, Nova Zelândia, Austrália e Canadá aprovaram um pacote de sanções econômicas contra a Rússia. Putin reagiu anunciando medidas retaliatórias contra o Ocidente, bloqueando ou restringindo importações de alimentos provenientes dos países que sancionaram a Rússia. Com isso, Moscou obrigou-se a buscar alternativas internas e diversificar a sua economia.
“A Rússia se transformará em um dos líderes do mercado global agroindustrial nos próximos anos”, afirmou Putin, em 2018, em um encontro com agricultores no sul do país. Na ocasião, ele ressaltou aos produtores que as exportações agrícolas já superavam a exportação de armas, o que não é pouca coisa para um país com tradição bélica. Foram, segundo dados do governo russo, US$ 28,8 bilhões do setor agrícola contra US$ 15,6 bilhões do de defesa. E previu que, até este ano, a Rússia exportaria mais alimentos do que importa.
A política de incentivos à agricultura incluiu subsídios pesados (iniciada em 2011, atinge mais de 50% da produção local) e investimentos maciços em infraestrutura para escoamento. A seu favor contou também uma ajuda involuntária do clima. A elevação da temperatura média em algumas regiões antes impróprias para o cultivo permitiu que novas fronteiras agrícolas fossem abertas ao norte dos mares Negro e Cáspio, passando pela região do Volga, dos montes Urais, até a Sibéria Ocidental. A estimativa é que possam ser adicionados 57 milhões de hectares até 2050.
De acordo com o Roshydromet, Serviço Federal de Hidrometeorologia e Meio Ambiente, em algumas regiões as temperaturas mais amenas permitiram o aumento da capacidade nominal de cultivo de grãos em até 30%, segundo reportagem publicada pela revista Plant Project em 2018, quando a Rússia sediou a Copa do Mundo. E, a persistirem em elevação, regiões como o norte do Cáucaso e do baixo Volga, por exemplo, podem se tornar produtoras de algodão, uvas, chá, frutas cítricas e legumes.
Putin, aparentemente, preparou-se para momentos como esse. O mundo, com fome de paz, parece que jamais estará preparado para enfrentar as dores semeadas por uma guerra.

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Santa Catarina registra avanço simultâneo nas importações e exportações de milho em 2025
Volume importado sobe 31,5% e embarques aumentam 243%, refletindo demanda das cadeias produtivas e oportunidades geradas pela proximidade dos portos.

As importações de milho seguem em ritmo acelerado em Santa Catarina ao longo de 2025. De janeiro a outubro, o estado comprou mais de 349,1 mil toneladas, volume 31,5% superior ao do mesmo período do ano passado, segundo dados do Boletim Agropecuário de Santa Catarina, elaborado pela Epagri/Cepa com base no Comex Stat/MDIC. Em termos de valor, o milho importado movimentou US$ 59,74 milhões, alta de 23,5% frente ao acumulado de 2024. Toda a origem é atribuída ao Paraguai, principal fornecedor externo do cereal para o mercado catarinense.

Foto: Claudio Neves
A tendência de expansão no abastecimento externo se intensificou no segundo semestre. Em outubro, Santa Catarina importou mais de 63 mil toneladas, mantendo a curva ascendente registrada desde julho, quando os volumes mensais passaram consistentemente da casa das 50 mil toneladas. A Epagri/Cepa aponta que esse movimento deve avançar até novembro, período em que a demanda das agroindústrias de aves, suínos e bovinos segue aquecida.
Os dados mensais ilustram essa escalada. De outubro de 2024 a outubro de 2025, as importações variaram de mínimas próximas a 3,4 mil toneladas (março/25) a máximas superiores a 63 mil toneladas (setembro/25). Nesse intervalo, meses como junho, julho e agosto concentraram forte entrada do cereal, acompanhados de receitas que oscilaram entre US$ 7,4 milhões e US$ 11,2 milhões.
Exportações crescem apesar do déficit interno
Em um cenário aparentemente contraditório, o estado, que possui déficit anual estimado em 6 milhões de toneladas de milho para suprir seu grande parque agroindustrial, também ampliou as exportações do grão em 2025.
Até outubro, Santa Catarina embarcou 130,1 mil toneladas, um salto de 243,9% em relação ao mesmo período de 2024. O valor exportado também chamou atenção: US$ 30,71 milhões, alta de 282,33% na comparação anual.

Foto: Claudio Neves
Segundo a Epagri/Cepa, essa movimentação ocorre majoritariamente em regiões produtoras próximas aos portos catarinenses, onde os preços de exportação tornam-se mais competitivos que os do mercado interno, especialmente quando o câmbio favorece vendas externas ou quando há descompasso logístico entre oferta e demanda regional.
Essa dinâmica reforça um traço estrutural conhecido do agro catarinense: ao mesmo tempo em que é um dos maiores consumidores de milho do país, devido ao peso das cadeias de proteína animal, Santa Catarina não alcança autossuficiência e depende do cereal de outras regiões e países para abastecimento. A exportação pontual ocorre quando há excedentes regionais temporários, oportunidades comerciais ou vantagens logísticas.
Perspectivas
Com a entrada gradual da nova safra 2025/26 no estado e no Centro-Oeste brasileiro, a tendência é que os volumes importados se acomodem a partir do fim do ano. No entanto, o comportamento do câmbio, os preços internacionais e o resultado final da produção catarinense seguirão determinando a necessidade de compras externas — e, por outro lado, a competitividade das exportações.
Para a Epagri/Cepa, o quadro de 2025 reforça tanto a importância do milho como insumo estratégico para as cadeias de proteína animal quanto a vulnerabilidade decorrente da dependência externa e interestadual do cereal. Santa Catarina continua sendo um estado que importa para abastecer seu agro e exporta quando a lógica de mercado permite, um equilíbrio dinâmico que movimenta portos, indústrias e produtores ao longo de todo o ano.
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Brasil e Japão avançam em tratativas para ampliar comércio agro
Reunião entre Mapa e MAFF reforça pedido de auditoria japonesa para habilitar exportações de carne bovina e aprofunda cooperação técnica entre os países.

OMinistério da Agricultura e Pecuária (Mapa), representado pelo secretário de Comércio e Relações Internacionais, Luis Rua, realizou uma reunião bilateral com o vice-ministro internacional do Ministério da Agricultura, Pecuária e Florestas (MAFF), Osamu Kubota, para fortalecer a agenda comercial entre os países e aprofundar o diálogo sobre temas da relação bilateral.
No encontro, a delegação brasileira apresentou as principais prioridades do Brasil, incluindo temas regulatórios e iniciativas de cooperação, e reiterou o pedido para o agendamento da auditoria japonesa necessária para a abertura do mercado para exportação de carne bovina brasileira. O Mapa também destacou avanços recentes no diálogo e reforçou os pontos considerados estratégicos para ampliar o fluxo comercial e aprimorar mecanismos de parceria.
Os representantes japoneses compartilharam seus interesses e expectativas, demonstrando disposição para intensificar o diálogo técnico e buscar convergência nas agendas de interesse mútuo.
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Bioinsumos colocam agro brasileiro na liderança da transição sustentável
Soluções biológicas reposicionam o agronegócio como força estratégica na agenda climática global.

A sustentabilidade como a conhecemos já não é suficiente. A nova fronteira da produção agrícola tem nome e propósito: agricultura sustentável, um modelo que revitaliza o solo, amplia a biodiversidade e aumenta a captura de carbono. Em destaque nas discussões da COP30, o tema reposiciona o agronegócio como parte da solução, consolidando-se como uma das estratégias mais promissoras para recuperação de agro-ecossistemas, captura de carbono e mitigação das mudanças climáticas.

Thiago Castro, Gerente de P&D da Koppert Brasil participa de painel na AgriZone, durante a COP30: “A agricultura sustentável é, em sua essência, sobre restaurar a vida”
Atualmente, a agricultura e o uso da terra correspondem a 23% das emissões globais de gases do efeito, aproximadamente. Ao migrar para práticas sustentáveis, lavouras deixam de ser fontes de emissão e tornam-se sumidouros de carbono, “reservatórios” naturais que filtram o dióxido de carbono da atmosfera. “A agricultura sustentável é, em sua essência, sobre restaurar a vida. E não tem como falar em vida no solo sem falar em controle biológico”, afirma o PhD em Entomologia com ênfase em Controle Biológico, Thiago Castro.
Segudo ele, ao introduzir um inimigo natural para combater uma praga, devolvemos ao ecossistema uma peça que faltava. “Isso fortalece a teia biológica, melhora a estrutura do solo, aumenta a disponibilidade de nutrientes e reduz a necessidade de intervenções agressivas. É a própria natureza trabalhando a nosso favor”, ressalta.
As soluções biológicas para a agricultura incluem produtos à base de micro e macroorganismos e extratos vegetais, sendo biodefensivos (para controle de pragas e doenças), bioativadores (que auxiliam na nutrição e saúde das plantas) e bioestimulantes (que melhoram a disponibilidade de nutrientes no solo).
Maior mercado mundial de bioinsumos
O Brasil é protagonista nesse campo: cerca de 61% dos produtores fazem uso regular de insumos biológicos agrícolas, uma taxa quatro vezes maior que a média global. Para a safra de 2025/26, o setor projeta um crescimento de 13% na adoção dessas tecnologias.
A vespa Trichogramma galloi e o fungo Beauveria bassiana (Cepa Esalq PL 63) são exemplos de macro e microrganismos amplamente utilizados nas culturas de cana-de-açúcar, soja, milho e algodão, para o controle de lagartas e mosca-branca, respectivamente. Esses agentes atuam nas pragas sem afetar polinizadores e organismos benéficos para o ecossistema.
Os impactos do manejo biológico são mensuráveis: maior porosidade do solo, retenção de água e nutrientes, menor erosão; menor dependência de fertilizantes e inseticidas sintéticos, diminuição na resistência de pragas; equilíbrio ecológico e estabilidade produtiva.
Entre as práticas sustentáveis que já fazem parte da rotina do agro brasileiro estão o uso de inoculantes e fungos benéficos, a rotação de culturas, a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) e o manejo biológico de pragas e doenças. Práticas que estimulam a vida no solo e o equilíbrio natural no campo. “Os produtores que adotam manejo biológico investem em seu maior ativo que é a terra”, salienta Castro, acrescentando: “O manejo biológico não é uma tendência, é uma necessidade do planeta, e a agricultura pode e deve ser o caminho para a regeneração ambiental, para esse equilíbrio que buscamos e precisamos”.



