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Cerrados e a travessia da ciência: 50 anos de transformação agrícola e compromisso com o futuro

Ao completar 50 anos, a Embrapa Cerrados celebra a transformação do bioma antes desacreditado em celeiro global, com agricultura de alta produtividade baseada em ciência, inovação e respeito ao meio ambiente.

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Foto: Fabiano Bastos

Há meio século, o Cerrado era visto por muitos como uma terra de impossibilidades, quase um deserto de terras vermelhas, de solos pobres, vegetação retorcida e longos períodos sem chuva. Um bioma que parecia desafiar a ideia tradicional de produtividade. Mas também era – e ainda é – o bioma do inesperado. Uma das regiões mais biodiversas do planeta, um mosaico de formas de vida.

Foto: Divulgação/Embrapa

E foi nesse território de desafios que a ciência decidiu fincar os pés – há exatos 50 anos, com a criação da Embrapa Cerrados. Naquele tempo, poucos acreditavam que seria possível transformar a terra vermelha do Planalto Central brasileiro em solo fértil, produtivo e sustentável. E hoje, cinco décadas depois, o resultado está nos números e, mais do que isso, na vida que brota de onde antes se dizia ser impossível.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a safra nacional de cereais, leguminosas e oleaginosas deve atingir, em 2025, 330 milhões de toneladas, um aumento de 12% em relação à do ano anterior. Mais da metade disso (50,4%) virá do Brasil Central. Nos últimos 34 anos, a produção agropecuária nacional avançou 471% – um inegável ganho de eficiência.

Quem cruza hoje o Centro-Oeste testemunha não mais o vazio, mas a vida em lavouras que se estendem pelo horizonte. A agricultura do Cerrado se diversificou — aqui se cultiva de tudo: café, girassol, maracujá, feijão, soja, milho, seringueira. Em áreas onde mal havia pasto para o gado, hoje se colhem até três safras ao ano.

Mas o mais surpreendente é a forma como foi feita essa transformação: com base na ciência, na inovação e no manejo sustentável dos recursos naturais. O que começou com a correção de solos ácidos usando calcário e gesso agrícola — este último, antes, um descarte da indústria — tornou-se insumo-chave para a competitividade da agricultura nacional.

Momento de celebração e reflexões

Neste 2025, ano em que a Embrapa Cerrados celebra 50 anos, é tempo de fazer uma retrospectiva e perguntar: o que aprendemos com os solos que um dia nos disseram serem inférteis, com o clima dito inóspito do bioma e da biodiversidade desconhecida até pouco tempo atrás?

A resposta não cabe em uma frase, tampouco se encerra em números. Mas é possível dizer que aquele Cerrado desacreditado é hoje o grande celeiro do Brasil. Mais de 50% da produção nacional de grãos vem de seus campos. O milho da segunda safra, que hoje colhemos em abundância, a soja que cobre o horizonte, o trigo que um dia foi exclusividade das regiões temperadas. Tudo isso floresceu onde antes só pastavam algumas poucas cabeças de gado.

Foto: Roberto Dziura Jr

Essa virada de chave não foi mágica – foi feita de ciência, insistência e muito empenho diante do desconhecido. Vários ouviram que era impossível cultivar aqui, que era sonho e, ainda assim, persistiram. E ao fazer isso, ajudaram a mudar o rumo da agricultura tropical, do próprio país e, por que não, do planeta?

Assim como a correção dos solos, a adaptação das culturas agrícolas às condições do Cerrado por meio do melhoramento genético foi crucial para o sucesso da agricultura topical. E em poucas décadas, veio a abundância. As lavouras de soja passaram de 18 milhões de toneladas em 1990 para uma estimativa de 164 milhões em 2025.

O trigo, com a cultivar BRS 264, resultado de décadas de pesquisa na Embrapa Cerrados, saiu de 20 para 160 sacas por hectare – recorde mundial, alcançado no município goiano de Cristalina. Tudo isso com tecnologias que diminuem o uso de insumos químicos e as emissões de carbono em milhões de toneladas por ano.

O Brasil se tornou competitivo não por esgotar seus recursos, mas por aprender a aproveitá-los da melhor maneira. A seleção de bactérias capazes de absorver o nitrogênio do ar e fixá-lo nas raízes das plantas levou ao uso da Fixação Biológica de Nitrogênio nas lavouras de soja. A tecnologia gera uma economia anual de US$ 16,4 bilhões ao substituir os fertilizantes nitrogenados, além de evitar a emissão de 206 milhões de toneladas de CO₂ equivalente, considerando apenas as lavouras de soja. Já nas lavouras de milho, é possível reduzir em até 24% as emissões de gases de efeito estufa por tonelada produzida.

O experimento de Integração Lavoura-Pecuária (ILP) mais antigo do Brasil, implantado na Embrapa Cerrados em 1991, é exemplo disso. Hoje, são mais de 17 milhões de hectares no Brasil com sistemas integrados que conservam o solo, diversificam a produção e diminuem a pressão pela abertura de novas áreas para produção de alimentos.

Há também os bioinsumos, alternativa sustentável aos insumos químicos, cuja adoção vem crescendo a uma taxa de 13% ao ano, com 156 milhões de hectares tratados, capazes de evitar a emissão de até 18,5 milhões de toneladas de CO₂. O país já desponta como líder global nesse setor.

Foto: Denis Ferreira Netto

Mais recentemente, a Embrapa Cerrados desenvolveu a Bioanálise de Solos (BioAS), que avalia a saúde dos solos, ferramenta crucial para orientar práticas de manejo mais sustentáveis, ajudando o agricultor a enxergar a vida que existe debaixo da terra e mantém a vida acima dela.

Também aqui, nos laboratórios da Embrapa Cerrados, nasceu o Zoneamento Agrícola de Risco Climático, tecnologia baseada em dados históricos que ajuda o produtor a decidir a melhor época de plantio para reduzir perdas causadas por adversidades climáticas, como secas e geadas.

Hoje, essa ferramenta é política pública usada em programas de crédito e de seguro agrícolas, proporcionando segurança aos nossos produtores rurais e aplicação mais eficiente de recursos públicos.

Diante de tantas conquistas, algumas perguntas devem permanecer: como queremos prosseguir? A resposta, mais uma vez, precisa vir da ciência. A agricultura que celebra recordes de produtividade precisa também liderar a transição para sistemas regenerativos com uso racional dos recursos naturais. E isso já está em curso.

O caminho iniciado por Edson Lobato, primeiro cientista brasileiro a receber o The World Food Prize, o “Prêmio Nobel” da Agricultura, e por tantos outros desbravadores precisa continuar com responsabilidade e visão de futuro. Afinal, como bem lembrou um produtor pioneiro da região, Luiz Vicente Ghesth, em sessão solene na Câmara Legislativa do Distrito Federal em homenagem aos 50 anos da Embrapa Cerrados: “Não existe maior ato preservacionista no mundo como a possibilidade de produzir três safras em uma mesma área, sem precisar abrir novas fronteiras”. Este é o desafio: aumentar a produção, sim, mas com respeito aos recursos naturais do bioma.

A agricultura tropical que hoje orgulha o mundo foi construída também por nós, com ciência, suor e sonho. A Embrapa Cerrados, ao completar 50 anos, carrega em sua história a honra de ter participado da transformação de uma das regiões mais desafiadoras do Brasil em um polo global de produção de alimentos, fibras e energia. E carrega também a responsabilidade — e a oportunidade — de liderar os próximos passos: preservar, regenerar, integrar conhecimentos, promover uma agropecuária que respeite o solo, a água, o clima e o ser humano.

Fonte: Por Sebastião Pedro, chefe-geral da Embrapa Cerrados

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Comunicação e Marketing como mola propulsora do consumo de carne suína no Brasil

Se até pouco tempo o consumo era freado por percepções equivocadas, hoje a comunicação correta, direcionada e baseada em evidências abre caminho para quebrar paradigmas.

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Foto: Claudio Pazetto

Artigo escrito por Felipe Ceolin, médico-veterinário, mestre em Ciências Veterinárias, com especialização em Qualidade de Alimentos, em Gestão Comercial e em Marketing, e atual diretor comercial da Agência Comunica Agro.

O mercado da carne suína vive no Brasil um momento transição. A proteína, antes limitada por barreiras culturais e mitos relacionados à saúde, vem conquistando espaço na mesa do consumidor.

Se até pouco tempo o consumo era freado por percepções equivocadas, hoje a comunicação correta, direcionada e baseada em evidências abre caminho para quebrar paradigmas. Estudos recentes revelam que o brasileiro passou a reconhecer características como sabor, valor nutricional e versatilidade da carne suína, demonstrando uma mudança clara no comportamento de compra e consumo. É nesse cenário que o marketing se transforma em importante aliado da cadeia produtiva.

Foto: Shutterstock

Reposicionar para crescer

Para aumentar a participação na mesa das famílias é preciso comunicar aquilo que o consumidor precisava ouvir:
— que é uma carne segura,
— rica em nutrientes,
— competitiva em preço,
— e extremamente versátil na culinária.

Campanhas educativas, conteúdos informativos e a presença mais forte nas mídias sociais têm ajudado a construir essa nova imagem. Quando o consumidor entende o produto, ele compra com mais confiança – e essa confiança só existe quando existe uma comunicação clara e alinhada as suas expectativas.

O marketing não apenas divulga, ele conecta. Ao simplificar informações técnicas, aproximar o produtor do consumidor e mostrar maneiras práticas de preparo, a comunicação se torna um instrumento de transformação cultural.

Apresentar novos cortes, propor receitas, explicar processos de qualidade, destacar certificações e reforçar a rastreabilidade são estratégias que aumentam a percepção de valor e, consequentemente, estimulam o consumo.

Digital: o novo campo do agro

As redes sociais se tornaram o “supermercado digital” do consumidor moderno. Ali ele busca receitas, tira dúvidas, avalia produtos e

Foto: Divulgação/Pexels

compartilha experiências.
Indústrias, cooperativas e associações que investem em presença digital tornam-se mais competitivas e ampliam sua capacidade de influenciar preferências.

Vídeos curtos, reels com receitas simples, influenciadores culinários e campanhas segmentadas têm desempenhado papel fundamental na aproximação com o consumidor urbano, historicamente mais distante da realidade da cadeia produtiva e do campo.

Promoções e estratégias de varejo

Além do ambiente digital, o ponto de venda continua sendo o território decisivo da conversão. Embalagens mais atrativas, materiais explicativos, promoções e ações conjuntas com o varejo aumentam a visibilidade e reduzem a insegurança de quem tomando decisão na frente da gondola.

Marketing como elo da cadeia produtiva

A cadeia de carne suína brasileira é altamente tecnificada, sustentável e reconhecida, mas essa excelência precisa ser comunicada. O marketing tem o papel de unir elos – do campo ao consumidor – e transformar conhecimento técnico em mensagens simples e que engajam.

Fonte: O Presente Rural com Felipe Ceolin
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Expandir sem desmatar: a lógica econômica que vai muito além do discurso

Recuperar áreas degradadas e investir em produtividade sustentável é hoje o caminho mais rentável e estratégico para o agro brasileiro crescer sem comprometer o meio ambiente.

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Foto: Juliana Sussai

Dias atrás reli um artigo do pesquisador da Embrapa e membro do Conselho Científico Agro Sustentável, Décio Luiz Gazzoni, sobre a expansão agrícola sem desmatamento. O texto, publicado em 2023, ainda é muito atual e me fez refletir novamente sobre algo que sempre defendo: a sustentabilidade não é apenas uma exigência ambiental, é uma decisão econômica inteligente.

Como economista e alguém que acompanha o agro de perto, inclusive viajando para conhecer iniciativas em diferentes países, vejo com muita clareza o que Gazzoni já apontava: a grande fronteira do crescimento brasileiro está dentro das áreas já abertas, principalmente nas pastagens degradadas.

Artigo escrito por Fábio Torquato, economista, formado em Relações Internacionais e fundador da AgroTravel – Foto: Divulgação/AgroTravel

E os números mais recentes reforçam essa visão. Estudos da Embrapa, publicados na revista internacional Land, indicam que o Brasil possui cerca de 27,7 milhões de hectares de pastagens degradadas. Isso significa que temos uma área gigantesca pronta para ser recuperada e incorporada à produção, sem a necessidade de avançar sobre novos biomas.

Além disso, durante a COP29, que aconteceu ano passado em Baku, no Azerbaijão, o Brasil lançou o Programa Nacional de Conversão de Pastagens Degradadas (PNCPD), que prevê US$ 120 bilhões em investimentos nos próximos dez anos para recuperar 40 milhões de hectares. O número do programa é maior do que o estimado pela Embrapa porque considera áreas em diferentes graus de degradação, aptas para conversão produtiva ao longo dos anos.

Do ponto de vista econômico, é um movimento que faz todo o sentido. Segundo o Broto Notícias, o custo de recuperação de uma pastagem varia de R$ 6 mil a R$ 30 mil por hectare, dependendo do nível de degradação, tipo de solo e métodos adotados. Parece caro? Talvez à primeira vista. Mas quando olhamos para o retorno — aumento de produtividade por hectare, redução de custos operacionais e acesso a mercados premium que pagam mais por produtos rastreáveis e sustentáveis — a conta fecha rapidamente.

Vi isso acontecer em fazendas que visitei em viagens técnicas com a AgroTravel ao redor do mundo.

Como bem lembra Gazzoni, o produtor brasileiro já tem tecnologia e conhecimento para fazer essa virada. O que falta, muitas vezes, é entender que sustentabilidade é investimento, e não custo. E agora, com bilhões de dólares disponíveis em crédito via BNDES, Banco do Brasil e fundos internacionais, esse argumento fica ainda mais forte.

Estamos acompanhando os trabalhos da COP30, que este ano acontece no Brasil, e o mundo inteiro está olhando para nosso país. A oportunidade está escancarada: quem se antecipar, quem enxergar a recuperação de pastagens como um ativo estratégico, vai liderar o agro brasileiro do futuro.

Sempre digo nos grupos que acompanham as viagens da AgroTravel: o futuro do agro não está em abrir novas áreas, mas em transformar cada hectare já aberto em um ativo de alta performance. O artigo de Gazzoni só reforçou o que vejo na prática. E, como economista, reafirmo: essa é a equação mais inteligente que já tivemos nas mãos.

Fonte: Assessoria AgroTravel
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Meio ambiente e cooperativismo

Movimento econômico e social baseado em valores éticos e solidários, o cooperativismo reafirma, em tempos de COP 30, seu papel essencial na construção de um futuro sustentável, unindo produção, preservação e desenvolvimento coletivo.

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Foto: Divulgação/Sistema Faep

As cooperativas representam o mais elevado estágio da organização humana em torno de valores éticos, solidários e sustentáveis. Elas não existem apenas para gerar resultados econômicos, mas para promover o desenvolvimento coletivo em harmonia com o meio ambiente e com as comunidades em que atuam. Por essência e por princípios universais, o cooperativismo defende a preservação da natureza, a gestão responsável dos recursos e o equilíbrio entre produção e sustentabilidade. Esse compromisso ambiental não é um apêndice, mas uma convicção enraizada na própria identidade cooperativista.

Artigo escrito por Vanir Zanatta, presidente da Organização das Cooperativas do Estado de Santa Catarina (OCESC).

Em tempos de COP 30 é essencial lembrar que, nas cooperativas, cada decisão administrativa, cada projeto de ampliação e cada investimento em unidades industriais, agrícolas, logísticas ou administrativas é precedido por uma análise criteriosa dos impactos ambientais. O crescimento não se mede apenas em números, mas também na capacidade de reduzir emissões, otimizar o uso da água, reciclar resíduos e proteger a biodiversidade. É essa consciência prática e constante que diferencia o cooperativismo das demais formas de organização econômica. Ele entende que não há prosperidade possível em um planeta degradado, nem futuro para a economia sem o equilíbrio ambiental.

As cooperativas são parceiras leais do Poder Público na implementação de políticas voltadas ao meio ambiente. Estão sempre presentes em programas de reflorestamento, saneamento básico, manejo de resíduos, recuperação de nascentes e educação ambiental. Mas sua contribuição vai além da sustentabilidade ecológica — elas também participam ativamente de ações que promovem segurança, educação, cultura e mobilidade urbana, compreendendo que a proteção ambiental é inseparável da qualidade de vida e do bem-estar social. Onde há uma cooperativa, há compromisso com o futuro coletivo.

Essas instituições agem com coerência e exemplo, estimulando a cidadania e o senso de responsabilidade em seus empregados, cooperados, clientes e comunidades. Elas ensinam, pelo exemplo, que o progresso verdadeiro não nasce da exploração desenfreada, mas da gestão equilibrada e consciente dos recursos. O cooperativismo forma cidadãos engajados, capazes de compreender que o planeta é uma herança comum e que sua preservação é um dever de todos.

A defesa do meio ambiente é, portanto, um desdobramento natural dos princípios cooperativistas — entre eles, o interesse pela comunidade, a responsabilidade social e a intercooperação. Cada árvore preservada, cada solo recuperado e cada nascente protegida são expressões concretas de uma filosofia que valoriza a vida. As cooperativas não esperam por imposições legais ou incentivos externos para agir: elas o fazem porque acreditam que sua missão é cuidar das pessoas e do mundo em que elas vivem.

O cooperativismo é, por natureza, o caminho da sustentabilidade. Ele demonstra, todos os dias, que é possível crescer produzindo, prosperar preservando e inovar sem destruir. Em tempos de mudanças climáticas e desafios globais, as cooperativas reafirmam sua vocação de construir um mundo melhor, mais justo e solidário. Elas provam, com ações e resultados, que a economia pode — e deve — caminhar de mãos dadas com o meio ambiente. Essa é a essência do cooperativismo: servir, preservar e transformar.

Fonte: Artigo escrito por Vanir Zanatta, presidente da Organização das Cooperativas do Estado de Santa Catarina (OCESC).
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