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Agricultura, menos química, mais biologia
A evolução tecnológica sempre busca oferecer ao agricultor a oportunidade de solucionar seus problemas, com produtos mais amigáveis ao ambiente, sejam germoplasma (transgênico ou não) ou bioinsumos.

Os avanços na agricultura sempre dependeram da Ciência, para respaldar seu desenvolvimento tecnológico. As soluções baseadas na química foram, em parte, responsáveis por trazer a agricultura mundial ao patamar em que se encontra na atualidade, em especial no tocante aos produtos utilizados para nutrição vegetal e proteção contra pragas. Assim garantiu-se a oferta de alimentos, já que a fome no mundo subsiste por falta de renda para aquisição e não por incapacidade de produzir comida.
Entretanto, por sua própria natureza, a Ciência sempre evolui. Em nosso entender, estamos no limiar de uma nova era, na qual as soluções químicas tendem a ser paulatinamente substituídas por outras, com fulcro na biologia, sendo a biotecnologia e a biodiversidade os fundamentos dessa revolução científica.
Pulgão e vírus: uma ameaça ao trigo
Vou usar um exemplo europeu, pelo didatismo que torna fácil entender as mudanças que estão ocorrendo. Para controlar o pulgão do trigo –responsável por transmitir o vírus do nanismo amarelo da cevada (BYDV) – os agricultores da Europa utilizavam, até recentemente, inseticidas neonicotinoides. Eles são menos agressivos aos animais de sangue quente do que inseticidas tradicionais. Entrementes, eles têm mostrado impactos preocupantes sobre abelhas e algumas espécies aquáticas. Em consequência, desde 2022, existem restrições legais para uso dessa classe de inseticidas na Europa, o que poderia criar sérios problemas para o cultivo de cereais, o esteio da agricultura europeia.
Especificamente no Reino Unido, estima-se que 82% da área de trigo se encontra em risco com perdas de rendimento de até 60%, devido à incidência de BYDV. Para tentar controlar o problema, cerca de 60% das sementes são tratadas com neonicotinoides, para proteger as plantas nos primeiros dias após a emergência. Cessada a proteção inicial, quase 50% da área cultivada com trigo é pulverizada, para controlar o pulgão que transmite o BYDV. Porém, a proteção conferida pelos inseticidas é de, aproximadamente, sete dias. Portanto, 2-3 aplicações são necessárias, podendo afetar insetos benéficos, como os inimigos naturais das pragas e os polinizadores.
A busca de soluções
Soluções científicas não ocorrem no curto prazo. A história da busca de variedades resistentes ao BYDV começa na década de 1970, quando os inseticidas neonicotinoides sequer haviam ingressado no mercado. As dificuldades eram grandes, porque não havia registro de genes de resistência no germoplasma comercial ou nas linhagens utilizadas pelos melhoristas.
Os cientistas buscaram um caminho. Sabe-se que o trigo moderno se origina de uma hibridação natural entre espécies selvagens de Triticum, que ocorreram há 10.000 anos. Os cientistas repetiram o processo em laboratório, introjetando características desejáveis no trigo, que estão presentes em outras gramíneas silvestres. Cientistas do INRAE na França identificaram na grama Thinopyrum intermedium – um parente longínquo do trigo – a presença do gene Bdv2, o qual confere resistência ao vírus BYDV, introduzindo-o no trigo.
Concomitantemente, cientistas do CSIRO (Austrália) obtiveram duas cultivares de trigo resistentes ao BYDV, batizadas de Manning e Mackellar. O rendimento delas é bom se comparadas às cultivares suscetíveis, quando o ataque de BYDV é muito alto. Mas havia um sério problema: quando a incidência do vírus era muito baixa, as cultivares não se mostravam competitivas, pelo seu baixo rendimento de grãos.
Perseverança científica
Esse é um conflito comum no melhoramento de plantas porque, às vezes, junto com o(s) gene(s) desejado(s) são transferidas “por arrasto” outras características, que são deletérias. O desafio para os cientistas é descartar as plantas com os genes que causam o baixo rendimento, retendo o(s) gene(s) de resistência. Embora possível, a probabilidade é baixa, razão pela qual o processo é trabalhoso, demorado e exige paciência, foco e persistência.
Ainda assim, haveria a defasagem de rendimento que precisaria ser compensada, porque, a cada ano, as novas cultivares têm um ganho médio de produtividade de 0,5%, se comparadas com as do ano anterior. O material genético estudado precisava igualar ou superar o avanço médio de 0,5% ao ano, que era obtido com as novas cultivares. Isso adiciona mais alguns anos ao trabalho no desenvolvimento de uma cultivar resistente ao vírus que, ao mesmo tempo, fosse altamente produtiva.
E, para complicar o enredo, foi nessa fase de obtenção de uma cultivar resistente ao vírus que surgiram os neonicotinoides. Para os produtores agrícolas aparentava ser a solução perfeita para o controle do BYDV. Felizmente, o melhoramento genético não foi interrompido. Houve o advento de novas ferramentas biotecnológicas, em especial os marcadores moleculares, permitindo verificar se o gene foi transferido para uma planta descendente de um cruzamento (linhagem) por análises laboratoriais, dispensando a observação a campo de cada um dos milhares de descendentes dos cruzamentos. Foi assim que surgiu uma linhagem muito promissora, que mais tarde seria uma cultivar comercial, denominada RGT Wolverine.
Em diversos experimentos, essa linhagem foi comparada com duas linhagens de trigo francesas, com carga genética quase igual entre si, que são chamadas de isolinhas. A diferença entre elas é que uma carregava a mesma resistência a BYDV que a linhagem RGT Wolverine, enquanto a outra era suscetível. Os testes de campo demonstraram que as linhagens resistentes raramente eram atacadas pelo vírus, ao contrário das suscetíveis. A próxima etapa foi comparar quatro linhagens contendo o gene Bdv2 com nove cultivares comercias. Todas as cultivares comerciais (suscetíveis) foram afetadas pelo BYDV, ao contrário das linhagens resistentes. Mas a produtividade era igual para todas. Bingo! Assim foi desenvolvida a Wolverine, uma solução biológica para substituir a solução química, resolvendo o problema do ataque do vírus BYDV, sem necessitar recorrer aos inseticidas.
É um novo mundo que se descortina, com soluções biológicas tão eficientes quanto as químicas, convencionais. A evolução tecnológica sempre busca oferecer ao agricultor a oportunidade de solucionar seus problemas, com produtos mais amigáveis ao ambiente, sejam germoplasma (transgênico ou não) ou bioinsumos.
A Ciência procura responder aos anseios da sociedade, com soluções factíveis e que atendem as demandas das partes envolvidas. Nessa trajetória, ocorrem quebras de paradigma. É o que entendemos que está ocorrendo nesta terceira década do século XXI: o surgimento de um número cada vez maior de inovações biológicas, que substituem as antigas soluções, baseadas na química.

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Comunicação e Marketing como mola propulsora do consumo de carne suína no Brasil
Se até pouco tempo o consumo era freado por percepções equivocadas, hoje a comunicação correta, direcionada e baseada em evidências abre caminho para quebrar paradigmas.

Artigo escrito por Felipe Ceolin, médico-veterinário, mestre em Ciências Veterinárias, com especialização em Qualidade de Alimentos, em Gestão Comercial e em Marketing, e atual diretor comercial da Agência Comunica Agro.
O mercado da carne suína vive no Brasil um momento transição. A proteína, antes limitada por barreiras culturais e mitos relacionados à saúde, vem conquistando espaço na mesa do consumidor.
Se até pouco tempo o consumo era freado por percepções equivocadas, hoje a comunicação correta, direcionada e baseada em evidências abre caminho para quebrar paradigmas. Estudos recentes revelam que o brasileiro passou a reconhecer características como sabor, valor nutricional e versatilidade da carne suína, demonstrando uma mudança clara no comportamento de compra e consumo. É nesse cenário que o marketing se transforma em importante aliado da cadeia produtiva.

Foto: Shutterstock
Reposicionar para crescer
Para aumentar a participação na mesa das famílias é preciso comunicar aquilo que o consumidor precisava ouvir:
— que é uma carne segura,
— rica em nutrientes,
— competitiva em preço,
— e extremamente versátil na culinária.
Campanhas educativas, conteúdos informativos e a presença mais forte nas mídias sociais têm ajudado a construir essa nova imagem. Quando o consumidor entende o produto, ele compra com mais confiança – e essa confiança só existe quando existe uma comunicação clara e alinhada as suas expectativas.
O marketing não apenas divulga, ele conecta. Ao simplificar informações técnicas, aproximar o produtor do consumidor e mostrar maneiras práticas de preparo, a comunicação se torna um instrumento de transformação cultural.
Apresentar novos cortes, propor receitas, explicar processos de qualidade, destacar certificações e reforçar a rastreabilidade são estratégias que aumentam a percepção de valor e, consequentemente, estimulam o consumo.
Digital: o novo campo do agro
As redes sociais se tornaram o “supermercado digital” do consumidor moderno. Ali ele busca receitas, tira dúvidas, avalia produtos e

Foto: Divulgação/Pexels
compartilha experiências.
Indústrias, cooperativas e associações que investem em presença digital tornam-se mais competitivas e ampliam sua capacidade de influenciar preferências.
Vídeos curtos, reels com receitas simples, influenciadores culinários e campanhas segmentadas têm desempenhado papel fundamental na aproximação com o consumidor urbano, historicamente mais distante da realidade da cadeia produtiva e do campo.
Promoções e estratégias de varejo
Além do ambiente digital, o ponto de venda continua sendo o território decisivo da conversão. Embalagens mais atrativas, materiais explicativos, promoções e ações conjuntas com o varejo aumentam a visibilidade e reduzem a insegurança de quem tomando decisão na frente da gondola.
Marketing como elo da cadeia produtiva
A cadeia de carne suína brasileira é altamente tecnificada, sustentável e reconhecida, mas essa excelência precisa ser comunicada. O marketing tem o papel de unir elos – do campo ao consumidor – e transformar conhecimento técnico em mensagens simples e que engajam.
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Expandir sem desmatar: a lógica econômica que vai muito além do discurso
Recuperar áreas degradadas e investir em produtividade sustentável é hoje o caminho mais rentável e estratégico para o agro brasileiro crescer sem comprometer o meio ambiente.

Dias atrás reli um artigo do pesquisador da Embrapa e membro do Conselho Científico Agro Sustentável, Décio Luiz Gazzoni, sobre a expansão agrícola sem desmatamento. O texto, publicado em 2023, ainda é muito atual e me fez refletir novamente sobre algo que sempre defendo: a sustentabilidade não é apenas uma exigência ambiental, é uma decisão econômica inteligente.
Como economista e alguém que acompanha o agro de perto, inclusive viajando para conhecer iniciativas em diferentes países, vejo com muita clareza o que Gazzoni já apontava: a grande fronteira do crescimento brasileiro está dentro das áreas já abertas, principalmente nas pastagens degradadas.

Artigo escrito por Fábio Torquato, economista, formado em Relações Internacionais e fundador da AgroTravel – Foto: Divulgação/AgroTravel
E os números mais recentes reforçam essa visão. Estudos da Embrapa, publicados na revista internacional Land, indicam que o Brasil possui cerca de 27,7 milhões de hectares de pastagens degradadas. Isso significa que temos uma área gigantesca pronta para ser recuperada e incorporada à produção, sem a necessidade de avançar sobre novos biomas.
Além disso, durante a COP29, que aconteceu ano passado em Baku, no Azerbaijão, o Brasil lançou o Programa Nacional de Conversão de Pastagens Degradadas (PNCPD), que prevê US$ 120 bilhões em investimentos nos próximos dez anos para recuperar 40 milhões de hectares. O número do programa é maior do que o estimado pela Embrapa porque considera áreas em diferentes graus de degradação, aptas para conversão produtiva ao longo dos anos.
Do ponto de vista econômico, é um movimento que faz todo o sentido. Segundo o Broto Notícias, o custo de recuperação de uma pastagem varia de R$ 6 mil a R$ 30 mil por hectare, dependendo do nível de degradação, tipo de solo e métodos adotados. Parece caro? Talvez à primeira vista. Mas quando olhamos para o retorno — aumento de produtividade por hectare, redução de custos operacionais e acesso a mercados premium que pagam mais por produtos rastreáveis e sustentáveis — a conta fecha rapidamente.
Vi isso acontecer em fazendas que visitei em viagens técnicas com a AgroTravel ao redor do mundo.
Como bem lembra Gazzoni, o produtor brasileiro já tem tecnologia e conhecimento para fazer essa virada. O que falta, muitas vezes, é entender que sustentabilidade é investimento, e não custo. E agora, com bilhões de dólares disponíveis em crédito via BNDES, Banco do Brasil e fundos internacionais, esse argumento fica ainda mais forte.
Estamos acompanhando os trabalhos da COP30, que este ano acontece no Brasil, e o mundo inteiro está olhando para nosso país. A oportunidade está escancarada: quem se antecipar, quem enxergar a recuperação de pastagens como um ativo estratégico, vai liderar o agro brasileiro do futuro.
Sempre digo nos grupos que acompanham as viagens da AgroTravel: o futuro do agro não está em abrir novas áreas, mas em transformar cada hectare já aberto em um ativo de alta performance. O artigo de Gazzoni só reforçou o que vejo na prática. E, como economista, reafirmo: essa é a equação mais inteligente que já tivemos nas mãos.
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Meio ambiente e cooperativismo
Movimento econômico e social baseado em valores éticos e solidários, o cooperativismo reafirma, em tempos de COP 30, seu papel essencial na construção de um futuro sustentável, unindo produção, preservação e desenvolvimento coletivo.

As cooperativas representam o mais elevado estágio da organização humana em torno de valores éticos, solidários e sustentáveis. Elas não existem apenas para gerar resultados econômicos, mas para promover o desenvolvimento coletivo em harmonia com o meio ambiente e com as comunidades em que atuam. Por essência e por princípios universais, o cooperativismo defende a preservação da natureza, a gestão responsável dos recursos e o equilíbrio entre produção e sustentabilidade. Esse compromisso ambiental não é um apêndice, mas uma convicção enraizada na própria identidade cooperativista.

Artigo escrito por Vanir Zanatta, presidente da Organização das Cooperativas do Estado de Santa Catarina (OCESC).
Em tempos de COP 30 é essencial lembrar que, nas cooperativas, cada decisão administrativa, cada projeto de ampliação e cada investimento em unidades industriais, agrícolas, logísticas ou administrativas é precedido por uma análise criteriosa dos impactos ambientais. O crescimento não se mede apenas em números, mas também na capacidade de reduzir emissões, otimizar o uso da água, reciclar resíduos e proteger a biodiversidade. É essa consciência prática e constante que diferencia o cooperativismo das demais formas de organização econômica. Ele entende que não há prosperidade possível em um planeta degradado, nem futuro para a economia sem o equilíbrio ambiental.
As cooperativas são parceiras leais do Poder Público na implementação de políticas voltadas ao meio ambiente. Estão sempre presentes em programas de reflorestamento, saneamento básico, manejo de resíduos, recuperação de nascentes e educação ambiental. Mas sua contribuição vai além da sustentabilidade ecológica — elas também participam ativamente de ações que promovem segurança, educação, cultura e mobilidade urbana, compreendendo que a proteção ambiental é inseparável da qualidade de vida e do bem-estar social. Onde há uma cooperativa, há compromisso com o futuro coletivo.
Essas instituições agem com coerência e exemplo, estimulando a cidadania e o senso de responsabilidade em seus empregados, cooperados, clientes e comunidades. Elas ensinam, pelo exemplo, que o progresso verdadeiro não nasce da exploração desenfreada, mas da gestão equilibrada e consciente dos recursos. O cooperativismo forma cidadãos engajados, capazes de compreender que o planeta é uma herança comum e que sua preservação é um dever de todos.
A defesa do meio ambiente é, portanto, um desdobramento natural dos princípios cooperativistas — entre eles, o interesse pela comunidade, a responsabilidade social e a intercooperação. Cada árvore preservada, cada solo recuperado e cada nascente protegida são expressões concretas de uma filosofia que valoriza a vida. As cooperativas não esperam por imposições legais ou incentivos externos para agir: elas o fazem porque acreditam que sua missão é cuidar das pessoas e do mundo em que elas vivem.
O cooperativismo é, por natureza, o caminho da sustentabilidade. Ele demonstra, todos os dias, que é possível crescer produzindo, prosperar preservando e inovar sem destruir. Em tempos de mudanças climáticas e desafios globais, as cooperativas reafirmam sua vocação de construir um mundo melhor, mais justo e solidário. Elas provam, com ações e resultados, que a economia pode — e deve — caminhar de mãos dadas com o meio ambiente. Essa é a essência do cooperativismo: servir, preservar e transformar.



