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A precificação de bioinsumos pelo Cepea: desafios e perspectivas para o estabelecimento de um mercado futuro

Formação de preços no mercado de commodities apoia-se em três pilares fundamentais: padronização técnica, transparência de informações e fungibilidade dos produtos.

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Foto: Divulgação/Abisolo

A emergência dos bioinsumos como alternativa sustentável aos insumos sintéticos na agricultura moderna representa uma transformação significativa no paradigma produtivo. Contudo, a consolidação desse mercado enfrenta um obstáculo fundamental: a precificação desses produtos biológicos, cuja natureza complexa e contextual difere radicalmente dos modelos estabelecidos para commodities agrícolas e insumos químicos tradicionais.

Foto: Freepik

Enquanto o mercado de commodities agrícolas opera com a previsibilidade de um relógio suíço – em que cada grão de soja ou saca de açúcar segue padrões rígidos de classificação e negociação –, o universo dos bioinsumos parece mais uma selva biológica vibrante, porém complexa. Essa disparidade não é acidental: reflete a natureza disruptiva desses produtos que prometem revolucionar a agricultura, mas que ainda lutam por um lugar ao sol nos mercados organizados.

A formação de preços no mercado de commodities apoia-se em três pilares fundamentais: padronização técnica, transparência de informações e fungibilidade dos produtos. Os bioinsumos, contudo, ao apresentarem características biológicas intrínsecas e maior variabilidade de desempenho, rompem com esse paradigma convencional, impondo a necessidade de desenvolver novos modelos de precificação que considerem sua natureza dinâmica e dependência do contexto, garantindo, assim, a eficiência e estabilidade deste mercado em desenvolvimento.

Com base na expertise acumulada ao longo de quatro décadas pelo Cepea na construção de indicadores para commodities agropecuárias, este estudo realiza uma análise pioneira dos desafios inerentes à formação de um mercado futuro para bioinsumos. A investigação não apenas identifica os obstáculos específicos deste emergente segmento, mas também estabelece um diálogo crítico com as experiências de outros setores, propondo um conjunto de estratégias para superar as atuais limitações de precificação e comercialização.

A complexidade inerente aos bioinsumos

A precificação de bioinsumos esbarra em três dimensões fundamentais de complexidade. Primeiramente, tem-se a heterogeneidade produtiva. Ao contrário das commodities, que seguem especificações técnicas rigorosas (como o teor de umidade ou pureza), os bioinsumos variam em composição microbiana, concentração e formulação. Dois produtos à base de Azospirillum brasilense, por exemplo, podem apresentar desempenhos distintos em campo devido a diferenças em cepas, veiculantes ou processos de produção.

Em segundo lugar, os desafios logísticos: microrganismos vivos exigem condições específicas de armazenamento e transporte, com prazos de validade consideravelmente mais curtos que os insumos convencionais. Essa característica limita a formação de estoques estratégicos e aumenta os custos de distribuição.

Por fim, a assimetria informacional: enquanto fertilizantes químicos têm composições abertas e amplamente conhecidas, muitos bioinsumos são protegidos por propriedade intelectual, com formulações patenteadas que dificultam comparações diretas entre produtos concorrentes.

Lições de mercados consolidados

Foto: Jonathan Campos

A história econômica oferece valiosos insights para a estruturação do mercado de bioinsumos. O caso das commodities agrícolas é particularmente ilustrativo. No início do século XX, produtos como café e algodão enfrentavam problemas similares de padronização e transparência. A criação de bolsas organizadas, o estabelecimento de classificações técnicas e a adoção de contratos padronizados foram fundamentais para transformar esses produtos em ativos negociáveis globalmente.

O mercado de vinhos fornece outra analogia relevante. Através do sistema de Denominações de Origem, conseguiu-se conciliar a diversidade intrínseca ao produto com a necessidade de padrões reconhecíveis pelo mercado. Da mesma forma, os bioinsumos poderiam adotar um sistema de classificação funcional, em que produtos seriam agrupados por tipo de ação (fixação de nitrogênio, controle biológico etc.) e eficácia mínima comprovada.

Elementos para um mercado futuro de bioinsumos

A construção de um mercado organizado para bioinsumos requer a implementação de quatro pilares fundamentais:

  1. Padronização técnica: Desenvolvimento de protocolos para classificação de bioequivalência, com parâmetros mensuráveis como concentração microbiana (UFC/g) e eficácia agronômica mínima em condições controladas.
  2. Infraestrutura de mercado: Criação de câmaras de compensação para gerenciar riscos biológicos e logísticos, similar ao modelo adotado pelo mercado de carbono. A implementação de contratos por “dose eficaz” (hectare tratado) em vez de volume bruto poderia proporcionar maior transparência.
  3. Tecnologia de rastreamento: Utilização de blockchain e IoT para monitorar desde a produção até os resultados em campo, criando um histórico de desempenho para diferentes lotes e formulações.
  4. Regulamentação adaptativa: Estabelecimento de mecanismos ágeis para registro de produtos, incluindo reconhecimento mútuo entre países e procedimentos simplificados para atualizações de formulações.

Considerações finais

A precificação de bioinsumos não deve buscar simplesmente replicar o modelo das commodities, mas sim desenvolver novos mecanismos que reconheçam sua natureza biológica singular. Tal como ocorreu com o petróleo no século passado – que evoluiu de um produto bruto para um ativo financeiro sofisticado –, os bioinsumos exigirão a criação de instrumentos específicos que capturem tanto seu valor agronômico quanto seu impacto ambiental.

Fonte: Por Heloisa Burnquist, professora da Esalq/USP e pesquisadora do Cepea

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Comunicação e Marketing como mola propulsora do consumo de carne suína no Brasil

Se até pouco tempo o consumo era freado por percepções equivocadas, hoje a comunicação correta, direcionada e baseada em evidências abre caminho para quebrar paradigmas.

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Foto: Claudio Pazetto

Artigo escrito por Felipe Ceolin, médico-veterinário, mestre em Ciências Veterinárias, com especialização em Qualidade de Alimentos, em Gestão Comercial e em Marketing, e atual diretor comercial da Agência Comunica Agro.

O mercado da carne suína vive no Brasil um momento transição. A proteína, antes limitada por barreiras culturais e mitos relacionados à saúde, vem conquistando espaço na mesa do consumidor.

Se até pouco tempo o consumo era freado por percepções equivocadas, hoje a comunicação correta, direcionada e baseada em evidências abre caminho para quebrar paradigmas. Estudos recentes revelam que o brasileiro passou a reconhecer características como sabor, valor nutricional e versatilidade da carne suína, demonstrando uma mudança clara no comportamento de compra e consumo. É nesse cenário que o marketing se transforma em importante aliado da cadeia produtiva.

Foto: Shutterstock

Reposicionar para crescer

Para aumentar a participação na mesa das famílias é preciso comunicar aquilo que o consumidor precisava ouvir:
— que é uma carne segura,
— rica em nutrientes,
— competitiva em preço,
— e extremamente versátil na culinária.

Campanhas educativas, conteúdos informativos e a presença mais forte nas mídias sociais têm ajudado a construir essa nova imagem. Quando o consumidor entende o produto, ele compra com mais confiança – e essa confiança só existe quando existe uma comunicação clara e alinhada as suas expectativas.

O marketing não apenas divulga, ele conecta. Ao simplificar informações técnicas, aproximar o produtor do consumidor e mostrar maneiras práticas de preparo, a comunicação se torna um instrumento de transformação cultural.

Apresentar novos cortes, propor receitas, explicar processos de qualidade, destacar certificações e reforçar a rastreabilidade são estratégias que aumentam a percepção de valor e, consequentemente, estimulam o consumo.

Digital: o novo campo do agro

As redes sociais se tornaram o “supermercado digital” do consumidor moderno. Ali ele busca receitas, tira dúvidas, avalia produtos e

Foto: Divulgação/Pexels

compartilha experiências.
Indústrias, cooperativas e associações que investem em presença digital tornam-se mais competitivas e ampliam sua capacidade de influenciar preferências.

Vídeos curtos, reels com receitas simples, influenciadores culinários e campanhas segmentadas têm desempenhado papel fundamental na aproximação com o consumidor urbano, historicamente mais distante da realidade da cadeia produtiva e do campo.

Promoções e estratégias de varejo

Além do ambiente digital, o ponto de venda continua sendo o território decisivo da conversão. Embalagens mais atrativas, materiais explicativos, promoções e ações conjuntas com o varejo aumentam a visibilidade e reduzem a insegurança de quem tomando decisão na frente da gondola.

Marketing como elo da cadeia produtiva

A cadeia de carne suína brasileira é altamente tecnificada, sustentável e reconhecida, mas essa excelência precisa ser comunicada. O marketing tem o papel de unir elos – do campo ao consumidor – e transformar conhecimento técnico em mensagens simples e que engajam.

Fonte: O Presente Rural com Felipe Ceolin
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Expandir sem desmatar: a lógica econômica que vai muito além do discurso

Recuperar áreas degradadas e investir em produtividade sustentável é hoje o caminho mais rentável e estratégico para o agro brasileiro crescer sem comprometer o meio ambiente.

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Foto: Juliana Sussai

Dias atrás reli um artigo do pesquisador da Embrapa e membro do Conselho Científico Agro Sustentável, Décio Luiz Gazzoni, sobre a expansão agrícola sem desmatamento. O texto, publicado em 2023, ainda é muito atual e me fez refletir novamente sobre algo que sempre defendo: a sustentabilidade não é apenas uma exigência ambiental, é uma decisão econômica inteligente.

Como economista e alguém que acompanha o agro de perto, inclusive viajando para conhecer iniciativas em diferentes países, vejo com muita clareza o que Gazzoni já apontava: a grande fronteira do crescimento brasileiro está dentro das áreas já abertas, principalmente nas pastagens degradadas.

Artigo escrito por Fábio Torquato, economista, formado em Relações Internacionais e fundador da AgroTravel – Foto: Divulgação/AgroTravel

E os números mais recentes reforçam essa visão. Estudos da Embrapa, publicados na revista internacional Land, indicam que o Brasil possui cerca de 27,7 milhões de hectares de pastagens degradadas. Isso significa que temos uma área gigantesca pronta para ser recuperada e incorporada à produção, sem a necessidade de avançar sobre novos biomas.

Além disso, durante a COP29, que aconteceu ano passado em Baku, no Azerbaijão, o Brasil lançou o Programa Nacional de Conversão de Pastagens Degradadas (PNCPD), que prevê US$ 120 bilhões em investimentos nos próximos dez anos para recuperar 40 milhões de hectares. O número do programa é maior do que o estimado pela Embrapa porque considera áreas em diferentes graus de degradação, aptas para conversão produtiva ao longo dos anos.

Do ponto de vista econômico, é um movimento que faz todo o sentido. Segundo o Broto Notícias, o custo de recuperação de uma pastagem varia de R$ 6 mil a R$ 30 mil por hectare, dependendo do nível de degradação, tipo de solo e métodos adotados. Parece caro? Talvez à primeira vista. Mas quando olhamos para o retorno — aumento de produtividade por hectare, redução de custos operacionais e acesso a mercados premium que pagam mais por produtos rastreáveis e sustentáveis — a conta fecha rapidamente.

Vi isso acontecer em fazendas que visitei em viagens técnicas com a AgroTravel ao redor do mundo.

Como bem lembra Gazzoni, o produtor brasileiro já tem tecnologia e conhecimento para fazer essa virada. O que falta, muitas vezes, é entender que sustentabilidade é investimento, e não custo. E agora, com bilhões de dólares disponíveis em crédito via BNDES, Banco do Brasil e fundos internacionais, esse argumento fica ainda mais forte.

Estamos acompanhando os trabalhos da COP30, que este ano acontece no Brasil, e o mundo inteiro está olhando para nosso país. A oportunidade está escancarada: quem se antecipar, quem enxergar a recuperação de pastagens como um ativo estratégico, vai liderar o agro brasileiro do futuro.

Sempre digo nos grupos que acompanham as viagens da AgroTravel: o futuro do agro não está em abrir novas áreas, mas em transformar cada hectare já aberto em um ativo de alta performance. O artigo de Gazzoni só reforçou o que vejo na prática. E, como economista, reafirmo: essa é a equação mais inteligente que já tivemos nas mãos.

Fonte: Assessoria AgroTravel
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Meio ambiente e cooperativismo

Movimento econômico e social baseado em valores éticos e solidários, o cooperativismo reafirma, em tempos de COP 30, seu papel essencial na construção de um futuro sustentável, unindo produção, preservação e desenvolvimento coletivo.

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Foto: Divulgação/Sistema Faep

As cooperativas representam o mais elevado estágio da organização humana em torno de valores éticos, solidários e sustentáveis. Elas não existem apenas para gerar resultados econômicos, mas para promover o desenvolvimento coletivo em harmonia com o meio ambiente e com as comunidades em que atuam. Por essência e por princípios universais, o cooperativismo defende a preservação da natureza, a gestão responsável dos recursos e o equilíbrio entre produção e sustentabilidade. Esse compromisso ambiental não é um apêndice, mas uma convicção enraizada na própria identidade cooperativista.

Artigo escrito por Vanir Zanatta, presidente da Organização das Cooperativas do Estado de Santa Catarina (OCESC).

Em tempos de COP 30 é essencial lembrar que, nas cooperativas, cada decisão administrativa, cada projeto de ampliação e cada investimento em unidades industriais, agrícolas, logísticas ou administrativas é precedido por uma análise criteriosa dos impactos ambientais. O crescimento não se mede apenas em números, mas também na capacidade de reduzir emissões, otimizar o uso da água, reciclar resíduos e proteger a biodiversidade. É essa consciência prática e constante que diferencia o cooperativismo das demais formas de organização econômica. Ele entende que não há prosperidade possível em um planeta degradado, nem futuro para a economia sem o equilíbrio ambiental.

As cooperativas são parceiras leais do Poder Público na implementação de políticas voltadas ao meio ambiente. Estão sempre presentes em programas de reflorestamento, saneamento básico, manejo de resíduos, recuperação de nascentes e educação ambiental. Mas sua contribuição vai além da sustentabilidade ecológica — elas também participam ativamente de ações que promovem segurança, educação, cultura e mobilidade urbana, compreendendo que a proteção ambiental é inseparável da qualidade de vida e do bem-estar social. Onde há uma cooperativa, há compromisso com o futuro coletivo.

Essas instituições agem com coerência e exemplo, estimulando a cidadania e o senso de responsabilidade em seus empregados, cooperados, clientes e comunidades. Elas ensinam, pelo exemplo, que o progresso verdadeiro não nasce da exploração desenfreada, mas da gestão equilibrada e consciente dos recursos. O cooperativismo forma cidadãos engajados, capazes de compreender que o planeta é uma herança comum e que sua preservação é um dever de todos.

A defesa do meio ambiente é, portanto, um desdobramento natural dos princípios cooperativistas — entre eles, o interesse pela comunidade, a responsabilidade social e a intercooperação. Cada árvore preservada, cada solo recuperado e cada nascente protegida são expressões concretas de uma filosofia que valoriza a vida. As cooperativas não esperam por imposições legais ou incentivos externos para agir: elas o fazem porque acreditam que sua missão é cuidar das pessoas e do mundo em que elas vivem.

O cooperativismo é, por natureza, o caminho da sustentabilidade. Ele demonstra, todos os dias, que é possível crescer produzindo, prosperar preservando e inovar sem destruir. Em tempos de mudanças climáticas e desafios globais, as cooperativas reafirmam sua vocação de construir um mundo melhor, mais justo e solidário. Elas provam, com ações e resultados, que a economia pode — e deve — caminhar de mãos dadas com o meio ambiente. Essa é a essência do cooperativismo: servir, preservar e transformar.

Fonte: Artigo escrito por Vanir Zanatta, presidente da Organização das Cooperativas do Estado de Santa Catarina (OCESC).
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